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Reino e a sua JUSTIÇA
Um
dos versos prediletos dos pregadores modernos é Mateus 6:33, onde Jesus
ordena: “Mas buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça, e todas
estas coisas vos serão acrescentadas”.
Este verso é
sistematicamente usado para convencer aos fiéis a priorizarem o Reino de
Deus, que para eles, limita-se à esfera eclesiástica. Priorizar o reino
de Deus é entendido como sinônimo de ser assíduo aos cultos e jamais
deixar de fazer suas contribuições. Família, negócios, lazer, tudo deve
ser preterido, em função da agenda da igreja local.
Mas
será exatamente isso que Jesus quis dizer? O que significaria “buscar o
Reino de Deus”? E mais: o que significaria buscar a justiça desse reino?
Geralmente,
a ênfase recai sobre o Reino, identificando-o com a igreja. E quanto à
justiça desse reino, por que é simplesmente ignorada? Afinal, a ordem de
Cristo é buscar em primeiro lugar o Seu Reino e a sua justiça.
Estaria
Jesus falando da justiça imputada aos pecadores, quando estes admitem
seu estado pecaminoso, recorrendo à misericórdia de Deus revelada na
Cruz? Estaria Ele falando da tão importante doutrina conhecida entre nós
como “justificação pela fé”?
Ou estaria Ele falando da justiça como o modo de vida proposto aos cidadãos do Reino de Deus?
Se
Jesus estava referindo-Se à Justiça de Deus, então é provável que Ele
estivesse falando da Justificação pela Fé. Mas Se Ele estava
referindo-Se à Justiça do Reino, logo, é mais plausível crer que Ele
estivesse falando da Justiça como práxis, como prática, e não apenas
como algo que nos é imputado. Mesmo porque, a justiça que nos é imputada
pela fé, não é resultado de qualquer busca humana, mas de uma
intervenção soberana de Deus. Nós não a buscamos. Ela nos encontrou, e
nos foi imputada pela fé.
Creio piamente que Jesus estava
falando da Justiça do Reino, que é a conseqüência prática que deve ser
encontrada na vida daqueles em quem foi imputada a Justiça de Deus.
Em
sua primeira epístola, João diz: “Se sabeis que ele é justo, sabeis que
todo aquele que pratica a justiça é nascido dele” (1 Jo.2:29). E mais:
“Quem não pratica a justiça não é de Deus, nem aquele que não ama a seu
irmão”(3:10b).
De fato, somos justificados pela fé
somente. Isto é, ao crermos no Filho de Deus, e na suficiência de Seu
sacrifício por nós, somos declarados justos no Tribunal Celestial. Não
somos inocentados, mas justificados. Ser declarado justo não é o mesmo
que ser declarado inocente. O inocente é aquele que não tem qualquer
culpa. Já o que foi justificado é aquele que teve sua culpa comprovada,
mas sua penalidade foi devidamente aplicada. Seu débito, portanto, fora
saldado. No caso, Cristo arcou com nossa penalidade na Cruz, morrendo em
nosso lugar.
Uma vez declarados justos, devemos buscar viver a Justiça do Reino de Deus.
Definição bíblica de justiça
Justiça
é dar a cada um o que lhe é de direito. Nas palavras de Paulo: “Dai a
cada um o que deveis” (Rm.13:7a). Toda vez que privamos alguém dos seus
direitos, cometemos injustiça.Paulo define o Reino de Deus como
“justiça, paz e alegria no Espírito Santo”, e afirma que “quem nisto
serve a Cristo, agradável é a Deus e aprovado pelos homens”
(Rm.14:17b-18). Quem disse que “agradar a Deus” e ser “aprovado pelos
homens” são coisas excludentes?
A igreja primitiva
experimentou cada uma destas dimensões do Reino de Deus, e por isso é
dito que os crentes caíam “na graça de todo o povo” (At.2:47). Eles
experimentavam uma verdadeira revolução, não apenas espiritual, mas
também social.
Onde quer que a mensagem do Reino era
pregada, havia grande alegria, até em cidades como Samaria, onde os
discípulos jamais imaginariam ser bem recebidos (At.8:8).
A
perseguição sofrida pela igreja era protagonizada pelas autoridades
judaicas e romanas, não pelo povo. Era justamente a popularidade daquela
nova seita, conhecida como “o Caminho”, que tanto incomodava às
autoridades, instigando-as ao ciúme.
Mas enquanto as
autoridades se corroíam de ciúmes, a igreja caía na simpatia das camadas
populares, que eram contagiadas pela alegria do Espírito.
Aos
poucos, a Igreja ía se espalhando pelo mundo, semeando a mensagem
subversiva e poderosa do Reino de Deus. E o resultado? Além de alegria
contagiadora, Lucas diz em sua reportagem que “as igrejas em toda a
Judéia, Galiléia e Samaria tinham paz. Eram fortalecidas e, edificadas
pelo Espírito Santo, se multiplicavam, andando no temor do
Senhor”(At.9:31). A consciência apaziguada gera relações pacíficas. Quem
não tem paz com Deus, não pode estar em paz consigo mesmo, e,
conseqüentemente, não consegue ter paz com o semelhante. A paz oferecida
por Cristo abrange a relação entre o ser humano e Deus, entre ele e
seus semelhantes, e entre ele e sua consciência. E é esta paz que
oferece o solo fértil, onde a Justiça possa ser semeada.
Tiago
diz: “Ora, o fruto da justiça semeia-se em paz para os que promovem a
paz” (Tg.3:18). Sem paz, torna-se impossível a frutificação da justiça
do Reino. A Paz produz o ambiente propício para que a justiça, uma vez
semeada, possa frutificar.
Alegria, paz, e... justiça!
Os
crentes primitivos buscavam e viviam a justiça do Reino de Deus, em
todas as suas implicações. E por isso, “não havia entre eles necessitado
algum”(At.4:34). Como Jesus havia predito, todas as coisas lhes seriam
acrescentadas, se buscassem prioritariamente a Justiça do Reino.
Porém,
o cumprimento desta promessa não se daria através de alguma intervenção
sobrenatural, mas através da prática da Justiça. Deus não faria chover
pão do céu, como fizera no deserto, durante a peregrinação do povo
hebreu.
A Ressurreição e a Ascensão de Cristo nos
introduziram na Era do Reino, assim como a atravessia do Jordão
introduziu Israel na terra da promessa. Enquanto os filhos de Israel
caminhavam no deserto, nunca lhes faltou maná. Mas tão logo foram
introduzidos na Terra Prometida, “cessou o maná; os filhos de Israel não
o tiveram mais, mas nesse ano comeram das novidades da terra de
Canaã”(Josué 5:12). Não faria sentido Deus manter aquilo por mais tempo,
uma vez que Canaã era uma terra fértil, pronta pra receber sementes e
frutificar.
Uma vez introduzidos no Reino, e recebido o
Espírito da Promessa, caberia aos crentes semear, e assim, terem todas
as suas necessidades supridas.
Jesus não mais
multiplicaria pães e peixes, como fez no deserto por duas vezes. Nem
promoveria pescas maravilhosas, como fez também por duas vezes. A partir
de agora, a provisão de Deus se manifestaria através de meios naturais
por Ele ordenados.
Os crentes primitivos perceberam logo
isso. Eles sabiam que os sinais miraculosos continuariam, mas que já não
visariam promover a satisfação de suas necessidades materiais. Lucas
nos informa que “muitas maravilhas e sinais eram feitos pelos apóstolos.
Todos os que criam estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam suas
propriedades e bens, e repartiam com todos, segundo a necessidade de
cada um”(At.2:43b-45). Os sinais realizados pelos apóstolos limitavam-se
a curas, libertação de espíritos malignos, algumas ressurreições, e
manifestações de dons espirituais. Entre eles, não havia nada como
multiplicação de pães, ou qualquer outro sinal que visasse suprir
necessidades materiais.
E quanto à promessa de que todas
as demais coisas seriam acrescentadas? Isso não incluiria coisas
materiais?É claro que sim. Mas o expediente usado por Deus seria outro, e
não pura intervenção sobrenatural. Isso se daria através daquilo que
Paulo chamou de “o caminho mais excelente”.
Seria vivendo o
amor derramado pelo Espírito no coração dos crentes, que a igreja
experimentaria o suprimento de todas as suas carências materiais. O Amor
e a Justiça devem caminhar sempre de mãos dadas. “O que segue a justiça
e o amor acha vida, prosperidade e honra” (Pv.21:21).
A intervenção sobrenatural se dava no coração dos crentes, à medida que a Palavra se multiplicava entre eles (At.12:24).
Lucas
dá testemunho de que “não havia entre eles necessitado algum. Pois
todos os que possuíam herdades ou casas, vendendo-as, traziam o preço do
que fora vendido, e o depositavam aos pés dos apóstolos. E repartia-se a
cada um, segundo a sua necessidade”(At.4:34-35).
Era assim que eles viviam a justiça do Reino de Deus. Eles tinham tudo em comum. Por isso, não havia necessitado entre eles.
E
quem pensa que tal estilo de vida começa e termina nas páginas de Atos
dos Apóstolos, está redondamente enganado. Já no Antigo Testamento os
judeus o experimentaram ao retornarem do exílio a Jerusalém. Neemais
conta que os levitas “leram no livro da lei de Deus, esclarecendo-a e
explicando o sentido, de modo que o povo pudesse entender o que se lia.
Então Neemias, que era o governador, e Esdras, sacerdote e escriba, e os
levitas que ensinavam o povo disseram a todo o povo: Este dia é
consagrado ao Senhor vosso Deus, pelo que não vos lamentais, nem
choreis. Pois todo o povo chorava, ouvindo as palavras da lei.
Disse-lhes mais: Ide, comei as gorduras, e bebei as doçuras, e enviai
porções aos que não têm nada preparado para si. Este dia é consagrado ao
nosso Senhor. Não vos entristeçais, pois a alegria do Senhor é a vossa
força (...) Então todo o povo se foi a comer, a beber, a enviar porçÕes e
a celebrar com grande alegria porque agora entendiam as palavras que
lhes foram comunicadas” (Nee.8:8-10,12).
Fenômeno bem
parecido ao ocorrido na igreja primitiva. Bastou que o povo entendesse a
Palavra, para que brotasse em seus corações a disposição de partilhar
seus pertences. Lucas relata que “os que de bom grado receberam a sua
palavra foram batizados (...) E perseveraram na doutrina dos apóstolos,
na comunhão, no partir do pão e nas orações”(At.2:41a, 42). Portanto,
este estilo de vida surge muito antes de Atos, e prossegue depois dele.
Paulo,
apóstolo dos gentios, o endossa em suas epístolas, onde nos ordena a
partilhar “com os santos nas suas necessidades” (Rm.12:13). Paulo sabia
que na Era do Reino, os crentes precisariam semear, e não esperar por
intervenções freqüentes dos céus. E esta semeadura se daria quando os
crentes se dispusessem a compartilhar seus bens. Como um visionário,
Paulo entendia que a Igreja deveria ser uma agência catalisadora e
distribuidora de recursos. Através da semeadura, os bens seriam
distribuídos, e assim, todos desfrutariam igualmente dos recursos
enviados por Deus.
Ao ordenar que os crentes de Corinto participassem desta graça, Paulo escreve:
“Mas,
não digo isto para que os outros tenham alívio, e vós aperto, mas para
igualdade. Neste tempo presente, a vossa abundância supra a falta dos
outros, para também a sua abundância supra a vossa falta, e haja
igualdade, como está escrito: O que muito colheu não teve demais, e o
que pouco, não teve falta”2 Coríntios 8:13-15.
Repare que
Paulo usa a analogia da semeadura para estimular os crentes a
partilharem uns com os outros. Ele sabia que a igreja era o Novo Israel,
que deixara o novo Egito (a Jerusalém apóstata)[1],
e agora havia recebido “um reino que não pode ser abalado” (Hb.12:28).
Portanto, a exemplo do antigo Israel, a Igreja deveria semear na boa
terra do Reino, e através disso, produzir a Justiça do Reino.
O
mesmo conceito é repetido por Pedro: “Servi uns aos outros conforme o
dom que cada um recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de
Deus” (1Pe.4:10). O que Deus dá a uns, é para que seja usado para
benefícios de outros. Deus não é injusto por dar a uns o que nega a
outros. Pelo contrário: Através disso, a Justiça de Deus se manifesta,
fazendo com que dependamos uns dos outros. Ninguém é auto-suficiente no
Reino de Deus. A igualdade ocorre quando a abundância de uns supre a
falta de outros, e vice-versa.
Respeitando o princípio da
semeadura, Paulo diz que nossa semeadura deveria ser “expressão de
generosidade, e não de avareza” (2 C.9:5b). E mais: “O que semeia pouco,
pouco também ceifará, e o que semeia com fartura, com fartura também
ceifará” (v.6).
Segundo o Apóstolo, a Deus compete prover a semente, mas a nós compete semeá-la.
“Ora,
aquele que dá a semente ao que semeia, e pão para o alimento, também
multiplicará a vossa sementeira, e aumentará os frutos da vossa
justiça”. 2 Coríntios 9:10.
Veja, ainda dependemos de
freqüentes intervenções de Deus. Ele ainda multiplica... não mais pães
ou peixes, e sim a nossa sementeira. Ele dá a semente. Ele provê
oportunidades de trabalho, aptidões profissionais, força física,
inspiração e motivação. Mas cabe a nós usar todos estes recursos para o
bem comum, e não apenas para satisfação de nossas necessidades e
cobiças.
Tiago afirma em sua epístola, que o motivo porque
muitos pedidos não são atendidos por Deus é que pedimos mal: “Pedis e
não recebeis porque pedis mal, para o gastardes em vossos prazeres”
(Tg.4:3). Pedir mal é pedir pensando somente em si. Devemos pedir que
Deus multiplique nossa sementeira, para que possamos ser bênção na vida
de outros.
Multiplicando nossa sementeira, Ele faz
aumentar os frutos da nossa justiça. E desta maneira, Ele espalha
recursos, em vez de fazê-los concentrar em algumas mãos somente. Paulo
revela que o propósito de Deus é “fazer abundar em vós toda a graça, a
fim de que tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda
boa obra. Conforme está escrito: Espalhou, deu aos pobres; a sua justiça
permanece para sempre”(vv.8-9).
Eis a justiça do Reino de
Deus em operação. Sua meta é espalhar recursos, e distribuí-los
justamente. Isso é o inverso do sistema que vemos no mundo, onde as
riquezas são concentradas em poucas mãos.
[1] Em Apocalipse 11:8 lemos que a cidade onde Jesus fora crucificado é espiritualmente chamada de Egito.
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