Por Maurício Zágari
Você já parou para
pensar por que Deus decidiu se revelar justamente por meio de um livro –
a Bíblia? Haveria centenas de maneiras diferentes de ele se apresentar à
humanidade e de expôr o plano de salvação, mas a estratégia adotada
pelo Senhor foi justamente tinta sobre papel. Claro, ao longo dos 1.500
anos em que as Escrituras foram escritas, não havia o formato de livro
que conhecemos hoje, com páginas coladas ou costuradas, capa e quarta
capa. A coisa era mais rústica, os textos eram registrados em pergaminho
ou em pele de animais curtida, em rolos enormes. A coisa evoluiu e o
formato chegou ao que temos em nossos dias. Mas, independente da forma, o
fato é que o conteúdo do que Deus tinha a transmitir à humanidade foi
gravado para as gerações futuras com tinta sobre uma superfície.
Contextualizando: livros. Teria sido à toa? Será que o Senhor não é
criativo o suficiente para ter bolado montes de outras maneiras de se
apresentar? Essa realidade nos desperta para a importância que têm os
livros. E não, este não é um post literário, o assunto é altamente
espiritual.
Recebi um comentário
aqui no APENAS de um irmão, que, democraticamente, expôs sua visão – que
respeito, mas da qual discordo com absoluta veemência. Escreveu ele:
“NÃO LEIAM O QUE ” HERNANDES DIAS LOPES ” OU QUALQUER OUTRO ” SUPOSTO ”
AUTOR CRISTÃO DIZEM ESTAR NA ESCRITURA , MAS LEIAM AS ” ESCRITURAS SEM
NENHUM — A C R É S C I M O — OU SEJA : ” SEM COMENTÁRIOS , SEM ESTUDOS
OU QUALQUER OUTRO ACRÉSCIMO QUE TE SUGIRAM QUE ISTO ACRESCENTAR LHE Á UM
ACRÉSCIMO A SUA VIDA ESPIRITUAL ! ! ! ISTO É UMA GRANDE MENTIRA ! ! !”
(sic). Confesso que pisquei bastante olhando isso, refleti por um longo
tempo e fiquei realmente triste por ver que ainda há aqueles que têm
esse tipo de visão. Por isso, decidi compartilhar alguns pensamentos
sobre esse assunto tão vital.
Primeiro, vamos falar sobre literatura em si, para depois tratarmos da questão espiritual.
Sem livros, a humanidade
ainda caçaria com lanças e se vestiria de pele de animais. Não teríamos
medicamentos, muito menos tecnologia, a educação seria extremamente
limitada e viveríamos em cavernas ou, se muito, em tendas. Por uma
simples razão: a escrita é o meio que permite transmitir conhecimento
entre as gerações. Se hoje conseguimos mapear o genoma humano e o dos
animais é porque as descobertas na área da genética ficaram registradas
em livros desde que Mendel analisou suas ervilhas. A coisa funciona
assim: eu dou um passo no conhecimento sobre algo, e registro em livros.
Daqui a pouco eu morro e meu filho vai pegar aquele conhecimento e
levá-lo um pouco mais além. Em seguida, ele morre e meu neto usa o
conhecimento registrado e o leva a um novo patamar. É assim que a
humanidade evoluiu: conhecimento transmitido em livros para futuras
gerações, que pegaram aquelas informações, leram e as levaram a novos
níveis. Como bem analisou Alberto Moravia, “Um livro não é um livro, mas
sim um homem que fala através do livro”. Já Jorge Luis Borges disse,
com muita sabedoria: “O livro é a grande memória dos séculos… se os
livros desaparecessem, desapareceria a história e, seguramente, o
homem”.
Sem livros, não teríamos
a medicina, viagens espaciais, arquitetura, engenharia, computadores,
cinema, automóveis… nada! Pois a transmissão oral é limitada: as pessoas
se esquecem do que ouviram, transmitem com erros naturais do
telefone-sem-fio e a coisa não avança muito. É preciso registrar o
conhecimento adquirido de forma precisa: livros são a solução. Histórias
do passado, poesia, avanços da matemática, até mesmo as historinhas que
você lê para seus filhos. Tudo chegou a nossos dias graças aos livros.
Monteiro Lobato escreveu: “Um país se faz com homens e livros”. Homem sábio.
Além da óbvia
preservação do conhecimento, a leitura proporciona um benefício
adicional. Malba Tahan escreveu: “Quem não lê mal fala, mal ouve, mal
vê”. O hábito de ler tem efeitos diretos sobre o nosso cérebro e, logo,
sobre as estruturas e os modelos de pensamento. Ler sobre matemática
desenvolve seu raciocínio lógico, treina sua mente na solução de
problemas da vida cotidiana. A leitura de obras de poesia estimula nosso
lado emocional e treina as habilidades mentais em uma série de áreas.
Ler romances de ficção trabalha nosso poder imaginativo, criativo e
lúdico. E por aí vai. Quando você assiste a um filme na TV, por exemplo,
tudo já está ali, pronto, exige-se pouquíssimo do cérebro, é como se o
puséssemos em pause. Não é necessário imaginar nada quando vemos um
longa-metragem. Mas, quando você lê em um livro palavras que descrevem
uma paisagem, uma pessoa, um cenário ou uma situação, seu cérebro
trabalha profundamente para construir todo esse mundo inexistente em sua
mente: literalmente, você cria um universo a partir do nada, constrói
realidades inteiras a partir de palavras, tira seu pensamento do zero e o
leva a 2.000 km/h no virar de uma página. A ciência já conhece os
efeitos benéficos da leitura, tanto que pessoas em idade avançada são
estimuladas a ler livros, escrever e até fazer palavras-cruzadas, como
forma de manter pleno o seu vigor mental.
Em resumo: ler é essencial para a vida – do indivíduo e da sociedade. E, claro, da igreja.
É por isso que sou um
crítico bem ranheta no que se refere ao abandono de ler livros para
ficar ciscando textinhos inócuos e minúsculos em redes sociais. Esse
hábito vai resultar em uma geração (ou mais de uma) mentalmente flácida,
sem capacidade crítica, destituída de novas ideias, que não vai avançar
seus sistemas de pensamento. Uma tragédia para a humanidade. E muitos
não enxergam isso, infelizmente. Ironicamente, o próprio Bill Gates
afirmou: “Meus filhos terão computadores, mas antes terão livros”.
Claro, ele não é bobo.
Pois bem, tendo visto a
importância da leitura para a perpetuação do conhecimento na humanidade e
para o nosso desenvolvimento mental, lógico, criativo e dedutivo,
abordemos agora a questão espiritual.
Lendo “O livro dos
mártires”, de John Foxxe, fui para sempre impactado acerca do tipo de
espiritualidade que eu deveria viver mas não vivo. Lendo “O sorriso
escondido de Deus”, de John Piper, percebi quanto o Senhor age em nós em
meio às maiores dificuldades da vida. Lendo “Cristianismo puro e
simples”, de C.S.Lewis, meus olhos foram abertos para a essência da vida
cristã. Lendo “O cristianismo através dos séculos”, de Earle E. Cairns,
acompanhei a evolução da Igreja desde a era apostólica até nossos dias.
Cada livro que lemos é uma galáxia a mais que acrescentamos ao nosso
universo.
Esta semana, uma irmã
que conheci algum tempo atrás, quando ela estava em crise espiritual, me
escreveu um e-mail que muito me emocionou. Ela relatou que hoje está
viva na sua fé, crescendo cada vez mais, e que o estopim para essa
transformação em sua espiritualidade foi a leitura do livro que escrevi,
“A Verdadeira Vitória do Cristão”. Isso é nada menos do que vidas sendo
tocadas por Deus por meio da literatura cristã. Desprezar esse
potencial transformador seria uma insanidade.
A Bíblia é um livro que
se basta. Mas – entenda bem o que vou dizer, para não soar como heresia –
que, muitas vezes, não traz em si explicações importantes para sua
compreensão. Como entender a geografia bíblica sem ler bons livros sobre
o assunto? O que aconteceu entre Malaquias a Mateus? Como assim, Israel
era dominado por Roma (até Malaquias, Roma não tinha nenhuma
expressividade)? A quem Jeremias está falando e sobre o quê? Por que
Esdras e Neemias entram no cânon fora da ordem cronológica? Com que
motivação João escreveu as suas três epístolas? Colossenses foi escrito a
partir de um contexto local específico, como entendê-lo sem entender o
que se passava em Colossos naquela época? Os hábitos e os costumes
bíblicos serão compreendidos como, sem bons livros que os expliquem a
nós? O que significa aquela confusão toda de taças e selos de
Apocalipse? Xerxes e Assuero eram a mesma pessoa? Etc., etc., etc. São
milhões de pontos de interrogação que ficariam no ar se não houvesse
instrução, transmitida por pessoas que estudaram por anos e se
especializaram em suas áreas de conhecimento bíblico. E que nos
presenteiam com seu conhecimento por meio de… livros.
Tal qual o irmão que
deixou o comentário reproduzido acima, já ouvi outras pessoas
criticarem, por exemplo, Bíblias de estudo. Acreditam que não se
deveriam publicar “Bíblias de estudo femininas”, por exemplo. Que
bobagem… É extremamente produtivo ler o texto bíblico acompanhado de
estudos que nos clarifiquem as ideias, que nos mostrem como podemos
viver uma vida espiritual mais sadia e rica a partir do que lemos com
focos específicos. Direcionar a leitura das Escrituras não é pecado, é
rico, é esclarecedor. Já contei em outros posts que cerca de um ano e
meio atrás reli os evangelhos com foco nas palavras de Jesus, para
tentar compreender o cerne da mensagem de Cristo. E se eu tivesse
escrito as minhas conclusões, as inserido no rodapé do texto bíblico e
publicado uma Bíblia focada nas palavras do Senhor? Que mal haveria
nisso, exceto se eu escrevesse heresias?
Devo muito a autores
como Luiz Sayão, Alister McGrath, C.S.Lewis, John Piper, Darren Patrick,
Dallas Willard, Augustus Nicodemus Lopes, Martin Lloyd-Jones, Charles
Spurgeon, Tim Keller, David Wraight, John Wesley, Max Lucado, Jonathan
Edwards, John Foxxe, John MacArthur, Mark Driscoll e tantos e tantos
outros, que se dispuseram a investir tempo e esforço para pôr no papel
conhecimento, ensinamentos, reflexões, exortações, consolações e outras
virtudes importantes para a fé cristã. São homens que, a partir da
Bíblia, criaram obras literárias extraordinárias, que ajudaram a forjar
muito do pouco que há de bom em mim. A eles só tenho gratidão.
Meu irmão, minha irmã,
não deixe que nada roube de você o tesouro que são os livros. Nada. Pois
a literatura cristã é um tesouro que vai contribuir para que você se
torne um servo de Deus melhor; mais versado na Palavra; mais sólido na
fé; mais refratário aos falsos ensinamentos; mais capacitado para
evangelizar; mais frutífero para a obra de Deus; e, em última mas não
menos importante instância, mais íntimo de Deus.
“Além de ser sábio, o
mestre também ensinou conhecimento ao povo. Ele escutou, examinou e
colecionou muitos provérbios. Procurou também encontrar as palavras
certas, e o que ele escreveu era reto e verdadeiro. As palavras dos
sábios são como aguilhões, a coleção dos seus ditos como pregos bem
fixados, provenientes do único Pastor” (Ec 12.9-11).
Leia. E leia muito! Leia
o máximo de livros que puder. Leia sem parar, um atrás do outro.
Invista seu dinheiro em livros, pois são um investimento em você mesmo e
no reino de Deus. Você só tem a ganhar – e, com isso, a contribuir para
a qualidade da Igreja de Nosso Senhor Jesus.
Acredito que a diferença
entre ler livros e não ler livros é a mesma diferença entre a grandeza e
a mediocridade. Pense grande. Aja grande. Leia.
Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício
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