Por Jorge Fernandes Isah
Desde o início do século
passado, com as manifestações carismáticas surgidas na Rua Azuza, em
Los Angeles, em 1906, pelas mãos do ministro negro, William Joseph
Seymour, que o Cristianismo, em nome de um "reavivamento", tem ensaiado
uma série de experiências que remontam aos primórdios da Igreja
Primitiva, mais especificamente o período apostólico, no séc. I. Mas,
esses dons teriam realmente voltado? Ou eles estariam circunscritos a um
momento histórico específico, e o que temos, hoje em dia, nada tem a
ver com o Espírito Santo, pois houve um hiato de quase dois mil anos
entre aquele e este período? Seriam as formas atuais as mesmas das
realizadas antigamente? E estariam em conformidade com os relatos
bíblicos e aplicados convenientemente como relatam os registros
sagrados?
Primeiramente, devemos
definir o que vem a ser dons apostólicos, mas antes disso, quem são os
apóstolos e qual era a sua missão. A palavra apóstolo significa enviado
ou mensageiro, aquele que anuncia algo ou alguém, e, no Novo Testamento,
a missão deles era a de anunciar Cristo e o seu Evangelho; e, para
isso, teriam de ser comissionados pelo próprio Senhor, chamados por ele
para exercerem essa missão, não sendo possível que alguém se
autointitule ou denomine-se a si mesmo com tal, sem sê-lo. Não há, na
Escritura, um só apóstolo que não tenha recebido o seu mandato
diretamente do Senhor, como nos revela o evangelista: "E, quando já era
dia, chamou a si os seus discípulos, e escolheu doze deles, a quem
também deu o nome de apóstolos" [Lc 6.13], e que não tenha convivido com
ele e testemunhado a sua ressurreição ]At 1.21-22].
Alguém pode dizer que os
apóstolos tinham o poder de nomear outros apóstolos e que esses
poderiam nomear outros e mais outros, continuamente, numa espécie de
apostolado sucessório, aos moldes do que a Igreja Católica reivindica
para o papado. Contudo, não se tem, na Bíblia, qualquer referência a
essa ordem sucessória, e os que hoje tentam reclamar para si mesmos
algum apostolado nada mais fazem do que repetir o erro romanista, ao
qual dizem oporem-se mas acabam por defendê-lo e inseri-lo em suas
práticas não-bíblicas.
Alguém ainda pode
insistir que Matias, o apóstolo nomeado a substituir Judas Iscariotes,
não foi diretamente nomeado por Cristo. Mas, espere um momento, para
quem propõe a ação do Espírito Santo em eventos no mínimo discutíveis
como os levantados pelo movimento carismático atual, pois estão muito
aquém ou além do texto bíblico, por que não reconhecer a ação do
Espírito de Deus na escolha do novo apóstolo? Houve oração e clamor para
que ele, que conhece todos os corações, mostrasse qual, dentre José e
Matias, seria o escolhido, "para que tome parte neste ministério e
apostolado... E, lançando-lhes sorte, caiu a sorte sobre Matias" [At
1.23-26]. Alegar que coisas estranhas à Palavra são supostamente
manifestações do Consolador [o qual é o Espírito de Cristo] e de que ele
não interviria em algo tão vital para a expansão do Evangelho,
parece-me um contra-senso.
Ainda alguém pode
alertar para o fato de Paulo não ter convivido com Jesus, e ainda assim,
foi feito apóstolo. Realmente, ele não foi testemunha direta do
ministério terreno do Senhor [ainda que tenha sido indiretamente], mas,
de uma forma especial e exclusiva, foi chamado pelo próprio Cristo,
sendo testemunha ocular da sua ressurreição. É o que ele nos diz:
"Paulo, apóstolo (não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por
Jesus Cristo, e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os mortos)" [Gl
1.1], e, ainda, ao falar das aparições de Cristo: "E por derradeiro de
todos me apareceu também a mim, como a um abortivo. Porque eu sou o
menor dos apóstolos, que não sou digno de ser chamado apóstolo, pois que
persegui a igreja de Deus" [1Co 15.8-9], e, mais uma vez: " Porque
aquele que operou eficazmente em Pedro para o apostolado da circuncisão,
esse operou também em mim com eficácia para com os gentios" [Gl 2.8].
Ora, temos que Paulo se colocou em posição de igualdade no ministério
apostólico de Pedro, apenas com a distinção quanto aos seus ouvintes, o
alvo da sua pregação.
Logo, não se pode falar
em apóstolos modernos, pois nenhum dos que assim se intitulam preenchem
as características necessárias: o chamado direto de Jesus, sobretudo,
como testemunhas irrefutáveis da sua ressurreição.
O Segundo ponto a ser
analisado é sobre a sua missão. Lembre-se de que à época, os apóstolos
estavam num período de transição entre a antiga e a nova aliança, e de
que a igreja estava sendo formada. Eles, como emissários de Cristo,
confirmariam indubitavelmente a verdade de que muitos sabiam, ainda que
vagamente, acerca de Jesus, sua missão, morte e ressurreição, como um
fato indiscutível e impreterível, levando-a tanto a judeus como a
gentios. Toda a obra apostólica se baseava nesse fundamento, de que
Cristo não somente era o Messias mas o Filho de Deus. O aspecto final
dessa missão foi que os apóstolos, inspirados pelo Espírito Santo,
escreveram e legaram à igreja, em todos os tempos, a santa e bendita
palavra de Deus. Nem uma só linha do Novo Testamento foi redigida por
alguém que não fosse apóstolo ou estivesse diretamente ligado a um
deles, no caso, eram seus discípulos que, orientados pelas fontes
primárias e sob a supervisão do Espírito, relataram os fatos
relacionados à pessoa de Jesus e seu ministério.
Com isso, chega-se
facilmente à conclusão de que não há mais revelações divinamente
inspiradas a serem transmitidas à Igreja, visto que o Cânon encontra-se
concluído, não necessitando a nenhum crente nenhuma outra orientação que
não esteja contida na Escritura Sagrada; o que nos leva a reconhecer
que o ministério apostólico transcorreu em um determinado momento da
história, e de que a missão daqueles homens chegou definitivamente ao
fim, sem que houvesse sucessores ou novos mensageiros. Até, porque, a
Igreja está edificada "sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas,
de que Jesus Cristo é a principal pedra de esquina; no qual todo o
edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor; no qual
também vós juntamente sois edificados para morada de Deus no Espírito"
[Ef 2.20-22], e, se uma casa não pode ter mais do que uma fundação, onde
nelas são construídas paredes, colunas, vigas, telhado, piso, etc, como
seria possível outro fundamento além daquele onde são dispostos o
princípio da fé, de que Cristo é a pedra de esquina? Além de
desnecessário é absurdo, e representaria a "invenção" de outra fé, de um
outro "cristianismo", o que muitos têm se especializado e empenhado em
produzir.
Outra conclusão
facilmente alcançável é: a igreja, quando se afasta desse entendimento,
ainda que seja minimamente, se torna alvo acessível para a investida dos
falsos-mestres e profetas e seus absurdos doutrinários. Invariavelmente
acabam por apostatar a fé, negando a verdade e penetrando a mentira,
instalando-se nela como uma genuína aberração religiosa, agindo ímpia,
incrédula e dolosamente na admissão e difusão de ideias contrárias e
excludentes à fé uma vez dada aos santos. Se no AT havia o ministério em
que os profetas de Deus expunham publicamente a falácia e malignidade
dos falsos-profetas, hoje, cabe-nos, como Igreja, denunciá-los e
expô-los como charlatões e falseadores da verdade. O princípio para isso
é um só, orientarmo-nos e deixar-nos guiar pela Escritura, através da
qual o Espírito Santo nos falará e conduzirá em toda a verdade.
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