Por Jason Todd
Muitos cristãos hoje
gostam de dizer que todos os pecados são “iguais” aos olhos de Deus, que
não há uma escala de pecados menores ou piores, que uma mentirinha ou
um homicídios são ambos o suficiente para que Cristo precisasse morrer
na cruz. Todos dizemos isso na teoria, mas na prática, sabemos que uma
mentirinha branca não vai te tirar da liderança da igreja. E um
homicídio provavelmente vai.
Na prática, há alguns
pecados que são socialmente aceitáveis, mesmo na igreja. Há um pecado em
particular que tem permeado nossa sociedade e nossas igrejas tão
silenciosamente que nós raramente prestamos atenção, que é a busca
constante por mais, por além do que é suficiente. Ou, usando uma palavra
mais feia, o que nós chamamos de glutonaria.
Quando eu penso sobre
glutonaria, eu penso em meu desejo de devorar uma dúzia de rosquinhas,
ajudando a descer com um copo de achocolatado. Ou talvez minha tendência
de alimentar meu estômago com salgadinhos quando já nem estou mais com
fome. Muitos de nós podem olhar para o pecado da glutonaria e pensar
“não é bem com isso que eu luto” ou “que mal há nisso?”. Afinal, a
maioria das congregações possuem pessoas que comem demais, e elas não
são consideradas “menos espirituais” ou “relapsas” por isso.
Mas a glutonaria não é
meramente um vício por comida. E se olharmos em sua definição e contexto
originais, a glutonaria se torna muito mais próxima das nossas vidas do
que gostaríamos de admitir.
Em sua forma mais
básica, glutonaria é o vício da alma no excesso. Ela ocorre quando o
gosto domina sobre a fome, quando o querer domina sobre o precisar. E em
nossa sociedade, onde “crescer na vida” é o mais comum dos ideais,
muitas vezes é difícil distinguir uma conquista merecida de um excesso
indulgente. Nesse sentido, mesmo os mais atléticos e musculosos entre
nós podem ser glutões. Qualquer um de nós pode ser.
Todo desejo por excesso
provém de uma falta de satisfação. Eu não estou satisfeito com a minha
porção – seja a porção no meu prato, no leito matrimonial ou na minha
conta bancária. Por não estar satisfeito com minha porção, eu busco uma
porção maior. Mas porque cada porção é uma parte finita de um todo
finito, estou constantemente buscando um excesso que nunca poderá
satisfazer.
Essa é a história de
Gênesis 3. Qual foi o pecado do Jardim do Éden, se não um desejo por
excesso? Adão e Eva receberam um paraíso para os olhos e para o paladar,
em total ausência de qualquer vergonha, mas o que fazia do jardim um
paraíso não era nada disso. Ali era um paraíso porque Deus andava na
viração do dia com eles. Apesar disso, a queda de Adão e Eva ocorreu
porque eles consideraram que mesmo isso não era suficiente. Eles não
estavam contentes com sua porção no paraíso, e então foram em busca –
com consequências desastrosas – de mais.
E como eles, somos seres
vorazes. Incorporamos desejos sem fundo sempre à procura da próxima
coisa atrativa. Nossos apetites são tão fortes quanto a morte, nos diz
Provérbios 27.20. Estamos sempre indo em busca da próxima coisa que
poderá satisfazer e aplacar nossa sede infinda. Essa inclinação sem fim é
o que move a glutonaria. É o que propulsiona nossas almas sempre em
direção ao excesso.
E mesmo assim, o desejo
por “mais” não é inerentemente mau, mas é quase sempre mal direcionado. O
que nós precisamos é de um apetite incansável pelo divino. Precisamos
de uma santa voracidade. Nossas carentes almas podem se voltar e serem
capturadas por uma bondade encontrada na presença do Deus todo glorioso.
Há apenas uma fonte infinita de satisfação que pode satisfazer nossos
desejos sem fim.
Uma pequena prova de Sua
graça suprema é o suficiente para atrair um apetite há muito
prisioneiro de porções menores. Se água roubada é doce, graça abundante é
ainda mais doce.
E há um efeito colateral
estranho: quanto mais bebemos do amor sem fim do Deus infinito, mais
nossos gostos serão transformados. A essência da graça vai permear cada
vez mais fundo as almas incansáveis dos mais carentes.
Na busca por porções
menores, nosso paladar foi anestesiado. Nos tornamos dormentes para
nossa fome real, nos enchendo com efemeridades. Mas quando voltamos à
fonte, nossos sentidos são renovados.
O Salmo 34.8 nos desafia
a enxergar a diferença: “Provai e vede que o SENHOR é bom”. Eu entendo
que Paulo entendeu esse verso quando disse ao povo de Listra que Deus dá
fartura e alegria para que nossos corações se convertam de coisas vãs e
se voltem para a satisfação suprema em quem Deus é (Atos 14.15.17).
Consequentemente, se
Deus ordenou que sua bondade seja vista e provada (e, implicitamente,
ouvida, cheirada e tocada), isso tem, pelo menos, duas implicações
diretas. Primeiro, isso significa que cada prazer e satisfação finitos
tem o objetivo de nos apontar para o prazer e a satisfação infinitos em
Deus. Minha admiração por um pôr-do-Sol não precisa, assim, parar no
horizonte, mas deve continuar e subir em adoração e gratidão. Em segundo
lugar, isso significa que se nosso desejo por “mais” for
mal-direcionado, então certamente ele pode ser redirecionado na direção
certa.
O desejo pelo excesso é
pecaminoso? Depende de se a alma está buscando um excesso finito ou um
excesso infinito. Será que nós sequer pensamos vorazmente em Deus? Nos
regozijamos nas chances de gastar alguns minutos a mais em oração,
afastados do mundo apenas para provar mais uma vez do divino? Quando foi
a última vez que ficamos compenetrados por muito tempo nas páginas de
uma Bíblia aberta por não conseguirmos parar de admirar o sabor doce
como o mel das verdades antigas? Se a Bíblia é a história do único bem
infinito, por que gastamos tanto de nossas vidas em banquetes tão
menores que ela?
Nós cristãos domamos
nosso deleite em Deus de tal forma que sequer imaginamos como seria
viver sempre em busca dEle. Se satisfazer em Deus é algo tão distante
para a maioria de nós quanto um estômago vazio. Por que não focamos
nossas almas na única bondade que pode lidar com nossos desejos? Por que
corremos atrás dos efêmeros sabores do dinheiro, da comida e do sexo?
Como disse George
MacDonald, “certas vezes eu acordo e, eis, já esqueci”. Dormir é como um
botão de reinício e minha fome muitas vezes é mal direcionada. Penso
ter fome do que é finito, mas minha necessidade real é Deus. Para nos
lembrarmos disso, precisamos provar profunda, constante e diariamente a
bondade de Deus. Então voltemo-nos e regozijemo-nos corretamente.
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