Por Maurício Zágari
Um
fenômeno incompreensível no nosso meio é a alegria que muitos
frequentadores de igreja demonstram quando um cristão cai em pecado. E
digo "frequentadores de igreja" não por acaso: um cristão de verdade
jamais se alegra com o pecado de ninguém. A verdade é que, enquanto
Jesus diz que "haverá maior alegria no céu por um pecador que se
arrepende, do que por noventa e nove justos que não necessitam de
arrependimento" (Lc 15.7), aqui na terra a turma se esbalda quando
alguém peca. Evidentemente não estou falando só de pecados gravíssimos,
terríveis, como: glutonaria, rancor, ira, maledicência, discórdia,
ciúmes, egoísmo, inveja e outros dessa estirpe (ou você achava que esses
pecados não eram sérios? Leia Gálatas 5.19-21).
Refiro-me basicamente à tríade sexo, poder e dinheiro - os grandes
pecados que elegemos para não perdoar, junto, é claro, com o álcool e o
cigarro. Envolveu um desses pecados e a turma vai adorar falar por anos a
fio sobre os envolvidos nessas histórias, que na cabeça do cristão
brasileiro são piores que a blasfêmia contra o Espírito Santo.
Não,
pecar não é correto. Não se justifica. É uma desobediência ao Rei dos
Reis. É feio. É condenável. Cheira mal às narinas do Santíssimo. Mas
permita-me abordar 4 aspectos da questão:
1. Absolutamente todo mundo peca. Eu e você, inclusive.
2.
Todos pecados são hediondos, mesmo os que você pratica e acha que não
são. O glutão é tão pecador como o assassino. O invejoso e o ciumento
são tão pecadores como o estuprador. Se você acha que o seu pecado é
menor do que o do bandido da boca de fumo, novamente sugiro que leia
Gálatas 5.19-21 e me diga se estou errado.
3.
Jesus encarnou como o Cordeiro de Deus que veio para tirar o pecado do
mundo. Depois da Cruz, ele concede o perdão a todo pecador que se
arrepende (a única exceção é a blasfêmia contra o Espírito Santo, mas
nesse caso não haveria arrependimento). E, se Deus já perdoou, quem você
pensa que é para continuar acusando o pecador arrependido?
4.
Alegrar-se quando alguém peca é tão pecado como qualquer outro, pois
vai contra o maior mandamento: amar o próximo como a si mesmo.
Apesar
dessas verdades, o que vejo ao meu redor é que o frequentador de igreja
em geral ama crucificar quem Deus já perdoou. Ama de paixão. Tem um
prazer e uma alegria sádicos de ficar apontando o pecado alheio. É como
se dissesse: "Hehehe, sou melhor do que você". Pior: há os que amam
ficar sabendo e tricotando sobre o pecado do outro. "Você não soube o
que fulana fez? Vou te contar, mas é só pra você orar por ela", diz o
fofoqueiro. "Pode contar, só quero saber para interceder por beltrano",
diz o frequentador de igreja com aparência de piedade mas que por dentro
está se escangalhando de se entreter com a desgraça do seu próximo.
Tudo pelo sádico prazer anticristão de ver o próximo se dar mal. Essa que é a pura verdade.
Pois
o cristão de fato não se alegra com a queda do irmão: o ajuda a se
reerguer, o preserva, chora com ele, proteje-o. Pois todo aquele que
escorregou tem o grande potencial de se tornar um cristão melhor após
ser reerguido pelo Espírito de Deus - basta ver o exemplo de Davi no
caso de Bateseba. E o cristão de verdade sabe disso e luta para que o
irmão que pecou torne-se um homem segundo o coração de Deus. Não pisa na
cabeça dele nem o acusa. Isso já tem alguém chamado Satanás para fazer,
nenhum ser humano precisa tomar do diabo aquilo que ele já fará
naturalmente. Quem o faz torna-se cúmplice dele.
Tomei
conhecimento de um caso envolvendo conhecidos meus que me encheu de
asco (desculpe, não acho uma palavra mais apropriada do que essa para
traduzir meus sentimentos). Vou usar nomes fictícios por razões óbvias.
Em uma certa igreja, Maria estava tendo um caso extraconjugal. Seu
marido, João, que era funcionário da igreja e morava num apartamento
funci
onal
de propriedade da mesma, não sabia, mas outros membros "cristãos"
tinham conhecimento do problema. E só ficavam pelas costas dele, fazendo
piadinhas, o chamando de nomes depreciativos e dizendo "muuuuu" em meio
a risinhos quando ele passava. Não consigo imaginar um comportamento
mais impiedoso. Diante disso, pastor Zezinho, um dos líderes da
congregação, chamou João para conversar e assim o marido acabou tomando
conhecimento do pecado da esposa. Mas o pastor disse-lhe que se
mantivesse afastado da mulher, pois se ele voltasse logo para ela
"haveria falatório entre os frequentadores da igreja". Só que João foi
para casa, conversou com Maria, houve um diálogo franco, muitas lágrimas
e reconciliação. E ele fez o que Jesus ensinou: a perdoou. No domingo
seguinte, apareceram na igreja como deveriam: juntos, reconciliados, de
mãos dadas. Um exemplo a ser seguido. Só que aí começou o massacre.
A
mando do pastor da igreja, João foi demitido. Não, você não leu errado:
por ter perdoado o pecado da esposa, o homem foi de-mi-ti-do de uma
igreja cristã. E ele, a mulher e o filho receberam ordem de despejo:
dentro de um certo prazo teriam que deixar o apartamento em que moravam.
Tudo porque, em vez de cumprir o ritual hipócrita do marido ferido que
passa um tempo afastado antes de perdoar a esposa que o traiu, João fez
exatamente o que Jesus ensinou: a perdoou - e demonstrou publicamente
seu gesto bíblico. João foi cristão. Maria, arrependida, foi cristã. Já o
que fizeram com eles foi a coisa menos cristã que já vi em toda minha
trajetória. Foi abominável. Tudo porque frequentadores de igreja fizeram
piadinhas com uma coisa grave e os líderes da igreja, que deveriam dar o
exemplo do que significa o Evangelho - dar a outra face, andar a
segunda milha, perdoar 70 vezes7 - agiram da forma menos bíblica que já
vi na minha vida. João, que, infelizmente, teve de se mudar para outra
cidade para sobreviver, ganhou minha admiração como um dos homens mais
cristãos que já conheci. Que passou por cima de seu orgulho e perdoou um
pecado cometido contra si.
Isso
lamentavelmente é o que acontece: quem peca mas age como Jesus disse
que deveria agir, mortifica sua natureza carnal e pede perdão por ter
ferido alguém e magoado o Senhor - é execrado publicamente. É visto como
um leproso. Ninguém da igreja quer mais se aproximar dele - afinal, é
"o pecador" e, sei lá, vai que isso é contagioso. Gente que não entendeu
nada do Evangelho. Que o Evangelho é arrepender-se, perdoar e ser
perdoado, ser restaurado e reerguido... e continuar.
Como
disse um sacerdote veterano certa vez, quando alguém lhe perguntou se
deveria perdoar alguém que praticou grande mal: "Bem... temos duas
opções: ou nós não o perdoamos ou fazemos o que a Bíblia
manda". Sim, a resposta do problema era matemática: 70 vezes 7. E a
equação estava resolvida. Esse relato me lembra uma frase de Jesus
quando uma certa mulher adúltera foi levada até ele, pois queriam
apedrejá-la. Você conhece a história. Disse o Cordeiro de Deus: "Visto
que continuavam a interrogá-lo, Jesus se levantou e lhes disse: 'Se
algum de vocês estiver sem pecado, seja o primeiro a atirar pedra nela'." (João 8.7).
Meu
irmão, minha irmã, perceba: você peca todo santo dia - por pensamentos,
palavras, atos e omissões. Você e eu não somos menos pecadores do que o
pior dos assassinos. Mas aí vem logo alguém com aquele argumento óbvio:
"Ah, eu peco, só que eu não vivo pecando". E eu perguntaria:
"Não vive pecando? Ok. Então me diga um único dia da sua vida em que
você não pecou". Pois é. Você e eu pecamos TODOS os dias das nossas
vidas, tirando talvez algum dia em que estivemos em coma. Fora esse,
você pecou TODOS os dias.
Então,
caro amigo vaidoso, glutão, fofoqueiro, invejoso, iracundo,
maledicente, preguiçoso, cobiçoso, egocêntrico, que não põe Deus acima
de todas as coisas, que deseja o mal ao próximo, que não prefere os
outros em honra, que devolve mal com o mal, que não perdoa as dívidas e
ofensas, que é rude com os outros, que desdenha os mais pobres, que
inveja os mais ricos, materialista, que tem inimizades e ciúmes, que tem
iras e discórdias, que promove dissensões e facções... meu querido,
lamento informar, mas você e eu vivemos SIM pecando. Di-a-ri-a-men-te. E
Paulo diz em Gálatas 5 que "não herdarão o reino de Deus os que tais
coisas praticam". Então, caro, estamos mal na fita - e carecemos da
graça de Deus tanto quanto quem você acha o pior dos pecadores.
É
a isso que Jesus se referia quando disse para olharmos a trave em nosso
olho antes de olhar o argueiro no olho do outro, caro frequentador de
igreja. Diante disso, se me permite, sugiro que a partir de hoje você
olhe menos para o pecado do seu próximo - em especial se por acaso você
sente aquela satisfação sádica de ver o pecador se arrebentar - e passe a
dirigir mais sua atenção para os seus próprios pecados e,
principalmente, para a Cruz de Cristo. Pois, pode acreditar: você vai
precisar muito dela no Dia do Juízo.
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