Por Pr. Silas Figueira
Texto Base At 6.1-7
INTRODUÇÃO
Onde há pessoas,
geralmente, há problemas; e onde existem problemas tem o dedo do diabo
nisso. Seja em nossa casa, no trabalho, na escola, num laser e porque
não dizer dentro da igreja do Senhor. Com o crescimento da Igreja
Primitiva - pois o Senhor havia concedido a Sua bênção ao trabalho dos
apóstolos tanto na pregação quanto nos milagres – é nos dito que um
problema surgiu dentro da igreja em Jerusalém em relação à distribuição
da ajuda as viúvas, pois as viúvas helenistas estavam sendo esquecidas
na distribuição diária. Com isso houve murmuração dessas viúvas em
relação aos apóstolos, dizendo que eles estavam favorecendo as viúvas
hebreias e as esquecendo.
Diante dessa situação os
apóstolos tiveram que tomar algumas decisões importantes para acabar
com aquela murmuração, pois os apóstolos não poderiam deixar as viúvas
desamparadas e nem deixar de fazer o que era realmente prioridade para
eles, que era a oração e a pregação da Palavra.
É importante observar
que esse ocorrido era mais um ataque do diabo a Igreja do Senhor. Em
Atos 4 fala-nos do primeiro ataque contra a igreja vindo de fora – a
perseguição por parte das autoridades judaicas. Em Atos 5 fala-nos do
ataque vindo de dentro, quando Satanás tentou corrompê-la com a
hipocrisia, com o casal Ananias e Safira. E o terceiro ataque, distrair
os apóstolos da oração e da pregação através de algumas viúvas
murmuradoras, para expor a igreja a erros e ao mal. Se ele tivesse
obtido sucesso em qualquer uma dessas tentativas, a nova comunidade de
Jesus teria sido aniquilada em sua infância.
No primeiro ataque o diabo tentou parar a Igreja através do medo; no segundo através da hipocrisia, de pessoas se passando por espirituais, mas não passavam de gente querendo a honra para si; e no terceiro ataque,
o diabo vem manhoso, mas tão perigoso quanto nas duas vezes. Pois agora
ele vem para desmoralizar a liderança apostólica.
Diante dos taques do
diabo os apóstolos não esmoreceram, muito pelo contrário, agiram com
garra e com coragem. Diante das autoridades judaicas não temeram, mas
disseram com toda autoridade:
“Chamando-os,
ordenaram-lhes que absolutamente não falassem, nem ensinassem em o nome
de Jesus. Mas Pedro e João lhes responderam: Julgai se é justo diante de
Deus ouvir-vos antes a vós outros do que a Deus; pois nós não podemos
deixar de falar das coisas que vimos e ouvimos” (At 418-20).
Diante da hipocrisia de
Ananias e Safira - quando esse casal soube que Barnabé havia vendido uma
propriedade e depositado aos pés dos apóstolos todo o dinheiro, pois
havia muitas pessoas necessitadas na igreja na época; esse casal achou
interessante esse ato e quis copiar. Eles vendem também uma propriedade,
mas retiveram parte do dinheiro, no entanto, dizem para os apóstolos
que aquela quantia era todo o valor da venda. Esse casal era mentiroso,
hipócrita e queria os holofotes para si. Diferente de Barnabé que não
fez isso para aparecer, mas para abençoar as pessoas necessitadas.
Diante desse confronto
com os apóstolos, esse casal veio a morrer. O Senhor os fulminou
imediatamente após serem confrontados. Veja At 5.1-11.
Nesse terceiro ataque de
Satanás os apóstolos tiveram que tomar decisões que evitasse a
continuidade da murmuração. Pois agora, o ataque era com a tentativa de
tirar o foco dos apóstolos da oração e da Palavra, ou seja, o intuito de
Satanás era distraí-los.
Observando esse texto nós podemos aprender com os apóstolos algumas lições importantes:
1 – PRIMEIRA LIÇÃO QUE APRENDO É QUE NA IGREJA SEMPRE HAVERÁ PROBLEMAS (AT 6.1).
O crescimento da igreja
sempre trará problemas, pois mais uma vez repetimos: onde há pessoas
surgem problemas. E os problemas precisam ser enfrentados.
Entendamos o que estava acontecendo – O texto de Atos 6.1 nos diz: “Ora,
naqueles dias, multiplicando-se o número dos discípulos, houve
murmuração dos helenistas contra os hebreus, porque as viúvas deles
estavam sendo esquecidas na distribuição diária”.
Todo pastor quer que sua
igreja cresça, mas com o crescimento surgem também os problemas. Não
foi diferente na Igreja Primitiva. John Stott falando a respeito da
Igreja Primitiva, nos chama a atenção à forma como temos olhado para
aquela Igreja. Ele diz que “existe o perigo de romantizarmos a igreja
primitiva, falando dela em tom solene, como se não tivesse falhas. Isso
significa fechar os olhos diante das rivalidades, hipocrisias,
imoralidades e heresias que atormentavam a igreja, como acontece ainda
agora”.
Esse problema surgiu
porque havia duas classes de judeus na igreja. O primeiro grupo era
composto pelos judeus que moravam em Jerusalém e Palestina e falavam o
aramaico, o idioma ancestral. Esse grupo orgulhava-se de não ter
assimilado nenhuma estrangeirice em sua cultura. O segundo grupo era
formado pelos judeus que haviam morado fora da Palestina por muitas
gerações, mas que depois do Pentecostes permaneceram em Jerusalém. Esses
judeus haviam esquecido o hebraico e falavam o grego. Os orgulhosos
judeus de fala aramaica tratavam com desprezo os judeus estrangeiros,
embora os hebreus falassem a língua grega. Essa fissura no
relacionamento manifestou-se na distribuição diária dos recursos
(dinheiro). A queixa acerca da ajuda dos pobres não passava de mero
sintoma de um problema mais profundo, a saber: os cristãos de língua
hebraica e os de língua grega estavam divididos em dois grupos
separados. E outro problema que havia era que os judeus de língua grega
tinham hábitos gregos. Não era só a língua que os separava.
Com esse problema
instalado dentro da igreja, ela estava enfrentando três problemas
seriíssimos: o orgulho, o preconceito e a divisão dentro da igreja. A
igreja que contava com a simpatia de todo o povo (At 2.47), não estava
sendo simpática com os seus irmãos estrangeiros que estavam dentro dos
seus arraiais.
Como o diabo é astuto.
Ele tentou amedrontar os discípulos, mas não conseguiu. Tentou se
infiltrar através da hipocrisia, mas foi desmascarado. Agora usa essa
última cartada: a desmoralização da liderança. Irmãos, se nós não
vigiarmos poderemos cair nos mesmos problemas que a Igreja Primitiva
estava enfrentando, pois o diabo nunca deixará de atacar a igreja.
Na igreja sempre haverá
pobres e ricos, letrados e analfabetos, brancos e negros, orientais e
ocidentais. Como nos fala em Ap 7.9,10:
“Depois destas
coisas, vi, e eis grande multidão que ninguém podia enumerar, de todas
as nações, tribos, povos e línguas, em pé diante do trono e diante do
Cordeiro, vestidos de vestiduras brancas, com palmas nas mãos; e
clamavam em grande voz, dizendo: Ao nosso Deus, que se assenta no trono,
e ao Cordeiro, pertence a salvação”.
Se o Senhor morreu por Sua Igreja que é composta por todos os povos quem somos nós para fazermos distinção de pessoas.
2 – SEGUNDA LIÇÃO QUE APRENDO É QUE CORREMOS O RISCO DA DISTRAÇÃO (AT 6.2).
Os apóstolos estavam
cientes de que aquele problema era grave e era necessário resolvê-lo.
Eles não fizeram “vista grossa” para o problema, pelo contrário, o
enfrentaram e procuraram solucioná-lo. Mas para isso eles deveriam
colocar outras pessoas para fazer tal tarefa, pois eles tinham outras
prioridades. E a prioridade deles era a oração e pregação da Palavra.
Tudo indica que até
aquele presente momento eram os doze que realizavam essa tarefa (At
4.35). Mas aquilo que funcionou bem ontem pode não funcionar tão bem
hoje. Como Moody costumava dizer: “É melhor colocar dez homens para
trabalhar do que tentar fazer o trabalho de dez homens”. Como diz a
minha esposa, na igreja não podemos dispensar nem a ajuda das crianças.
DISCERNINDO AS PRIORIDADES
A organização é
essencial – é preciso organizar a vida da igreja. Mas a questão é, até
que ponto? Isso é importante porque, quando a organização se torna mais
importante que a mensagem, inverte-se a posição do Novo Testamento e a
tragédia vem em seguida.
Observe o que os
apóstolos disseram a igreja: “Então, os doze convocaram a comunidade dos
discípulos e disseram: Não é razoável que nós abandonemos a palavra de
Deus para servir às mesas” (At 6.2). A expressão servir às mesas
significa garantir que as necessidades das viúvas sejam atendidas, ou
seja, ocupar-se de questões financeiras e administrativas. É bom deixar
claro que os apóstolos não viam a obra social inferior à obra pastoral,
ou a considerasse pouco digna para eles. Não era isso. Cabia a eles a
diaconia da palavra, e não a diaconia das mesas.
Por que os apóstolos se
posicionaram contra permanecerem nessa atividade? Porque para eles
naquele momento era errado colocar o “servir às mesas” antes da pregação
da palavra de Deus.
Creio que existam três razões para isso:
1º- Porque é sempre errado colocar o homem antes de Deus.
Assim como naquela época, o diabo quer fazer da criatura o centro de
tudo, ou seja, colocar o homem acima de Deus. E colocar o homem no
centro foi uma tentação muito sutil para a Igreja Primitiva. Não que
seja errado fazer a obra social, socorrer ao necessitado, mas os
apóstolos não foram chamados para esse serviço.
Se os apóstolos cedem a
essa tentação a humanidade não teria vindo a conhecer Deus e a Sua
Palavra, ou seja, eles nunca teriam tempo para pregar o Evangelho. Todos
os problemas do mundo atual decorrem do fato de que as pessoas não
conhecem Deus e o Evangelho de Jesus Cristo.
Saiba de uma coisa, não se pode colocar o homem antes de Deus porque Deus é sobre todos.
2º - Porque é errado colocar o corpo antes da alma.
O homem não é somente corpo. Existe a parte imaterial do homem que
necessita do alimento que só Deus pode alimentar. E esse alimento é o
Evangelho. Tanto que o apostolo Paulo define o ministro do evangelho
como despenseiro, ou seja, alguém responsável por dar o alimento às
pessoas de uma casa. Essa dispensa é a Bíblia.
A tragédia do homem é
que ele não se importa com a alma, geralmente só pensam nos prazeres
dessa vida. Como disse Paulo: “O deus deles é o ventre” (Fl 3.19). Quem
vive só pensando no corpo e não se preocupam em alimentar a alma vivem
por instinto, não passam de animais.
3º - Porque é errado colocar o tempo presente antes da eternidade.
O sustento do corpo pertence ao tempo. O sustento da alma pertence a
eternidade. Na vida de cada um de nós virá o dia em que não estaremos
interessados em comida e em que a comida não poderá ajudar-nos em nada;
estaremos muito além disso. Como disse Paulo: “Não atentando nós nas
coisas que se veem, mas nas que se não veem; porque as que se veem são
temporais, e as que se não veem são eternas” (2Co 4.18).
A Palavra de Deus sempre
tem que ter a prioridade, vindo até antes da beneficência e da bondade.
Se você puser alguma destas coisas em primeiro lugar, estará invertendo
coisas que nunca devem ser invertidas. Deus, depois o homem! A alma,
depois o corpo! A eternidade, depois o tempo!
Os apóstolos entenderam isso e não abriram mão de por em prática.
3 – TERCEIRA LIÇÃO QUE APRENDO QUE DIANTE DO PROBLEMA DEVEMOS BUSCAR A SOLUÇÃO (AT 6.3-6).
Os apóstolos entenderam a
legitimidade da diaconia das mesas. Eles reafirmaram a necessidade de
continuar a assistência aos pobres. A evangelização não anula a ação
social, nem esta dispensa aquela. Vemos através desse incidente o início
do ministério diaconal na igreja, que posteriormente foi legitimado
como lemos em 1Tm 3.8-13.
Os diáconos não foram
escolhidos pelos apóstolos, mas pela própria igreja. No versículo 5 nós
encontramos a relação dos escolhidos. É interessante observar que todos
os escolhidos têm nomes gregos, ou seja, eles nomearam exatamente entre
os helenistas. Isso nos mostra a graça de Deus e a obra do Espírito
Santo nos corações dos crentes de fala hebraica. Eles eram a maioria,
mas escolheram todos os diáconos do grupo da minoria. Estes sete teriam a
seu cargo a administração do fundo para os necessitados de ambos os
grupos. Desse modo, nenhuma queixa podia ser apresentada pelos de fala
grega.
Com isso o Senhor quebrou a primeira barreira dentro da igreja.
No entanto dentre os
escolhidos havia um que não era judeu de língua grega, mas era um
prosélito de Antioquia, ou seja, um gentio. Nicolau era grego de
nascença, um gentio no contexto da igreja de Jesus; alguém que
primeiramente havia se convertido ao judaísmo, mas agora estava
convertido ao cristianismo. Isso é uma total quebra de preconceito.
Mas para ser diácono
dentro do contexto da igreja naquela situação eram necessários alguns
critérios que têm sido esquecidos hoje em dia.
1º Boa reputação – Pessoas que dessem bom testemunho para com os de dentro da igreja como fora dela.
2º Cheios do Espírito Santo – Esses diáconos deveriam ser crentes em Jesus e terem uma vida santa e irrepreensível.
3º Cheios de sabedoria
– Esses diáconos deveriam saber minimizar e acabar com a murmuração das
pessoas contra os apóstolos. E discernindo as viúvas que eram dadas às
fraudes, às calúnias e à traição por palavras; pois, em seu trabalho de
administração do dinheiro, naturalmente se encontravam com muitas
pessoas dessa natureza. A sabedoria deles deveria ser tanto terrena
quanto espiritual, pois deveria discernir o erro e abençoar as que
deveriam ser socorridas. Veja o que Paulo falou a Timóteo sobre a
questão das viúvas em 1Tm 5.3-16. Com isso vemos que as fraudes eram constantes dentro da igreja e possivelmente dentro da igreja em Jerusalém nessa época.
No versículo 6 lemos:
“Apresentaram-nos perante os apóstolos, e estes, orando, lhes impuseram
as mãos”. É bom deixar bem claro que essa imposição de mãos não
simboliza nenhuma transferência de poder como muitos pensam e pregam.
Primeiro porque esses homens já eram cheios do Espírito Santo e mesmo
que não fossem tal coisa não ocorre. Essa imposição de mãos era como um
reconhecimento público do ministério que passariam a exercer e era um
pedido a Deus de suas bênçãos sobre eles para exercerem com êxito esse
ministério.
4 – QUARTA LIÇÃO QUE
APRENDO QUE QUANDO A LIDERANÇA SE DEDICA A ORAÇÃO E A PREGAÇÃO DA
PALAVRA HÁ CRESCIMENTO NA IGREJA (At 6.7).
O resultado da medida
tomada pelos apóstolos acalmou os ânimos dos helenistas, estancou a
murmuração, trouxe contentamento para a igreja, distribuiu o trabalho e
liberou os apóstolos para focarem no ministério que lhes havia sido
confiados. A palavra não pode se espalhar quando o ministério da palavra
está sendo negligenciado. Por outro lado, quando os pastores se dedicam
à Palavra, ela se espalha. O resultado é o que lemos no versículo 7: “Crescia
a palavra de Deus, e, em Jerusalém, se multiplicava o número dos
discípulos; também muitíssimos sacerdotes obedeciam à fé”.
Os dois verbos “crescia”
e “multiplicava” estão no tempo imperfeito, indicando que o crescimento
da palavra e a multiplicação da igreja eram contínuos. Mas saiba de uma
coisa, onde falta a Palavra cresce o pecado. Que não venhamos calar os
nossos lábios e nem nos distrairmos com problemas que podem nos tirar do
verdadeiro foco.
CONCLUSÃO
Há no Antigo testamento
uma declaração que penso ser uma das mais alarmantes de toda a Bíblia. O
Senhor adverte a nação de Israel por meio do profeta Amós que diz:
“Eis que vêm dias,
diz o SENHOR Deus, em que enviarei fome sobre a terra, não de pão, nem
sede de água, mas de ouvir as palavras do SENHOR” (Amós 8.11).
E essa é a calamidade
final porque, se você não ouvir a Palavra de Deus, nada lhe restará. As
coisas que se veem, baseado nas quais você vive não lhe trará nenhuma
esperança. Fome de ouvir a Palavra do Senhor, isso é muito pior do que
morrer de fome por falta de alimento, ou morrer de sede ou por alguma
enfermidade. Lembre-se do que disse Davi no salmo 42.1,2: “Como suspira a
corça pelas correntes das águas, assim, por ti, ó Deus, suspira a minha
alma. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando irei e me
verei perante a face de Deus?”
Por isso que os
apóstolos disseram: “Não é razoável que nós abandonemos a palavra para
servir s mesas”. (At 6.2b). Não que a obra social não seja importante,
mas sem a Palavra o povo perece.
Que o Senhor nos ajude a preservarmos o zelo pela Palavra sem omitirmos a obra social!