Por Maurício Zágari
A
proclamação do Evangelho deve ter como centro Jesus. A cruz. As
boas-novas da salvação. Sempre. Sempre. Sempre. Podemos pregar sobre
qualquer assunto correlato, desde que tenha ligação com o epicentro de
nossa fé: Cristo. Pregações sobre dízimo devem ter foco em Jesus.
Pregações sobre casamento devem ter foco em Jesus. Pregações sobre vida
sexual devem ter foco em Jesus. Pregações sobre arrependimento devem ter
foco em Jesus. Por isso, existe uma grande resistência em alguns
setores da Igreja a se pregar sobre o inferno, o diabo e os demônios. Em
grande parte, isso ocorre como reação à ênfase despropositada que
certas denominações dão à chamada “libertação”, em todas as suas
variáveis – “descarrego”, “batalha espiritual”, expulsão de demônios
etc. -, o que leva muitos a tomar uma postura contrária, eliminando
totalmente do púlpito mensagens que tenham a ver com as hostes
espirituais da maldade. Essa postura acaba se refletindo em todas as
esferas da vida cristã dos que assim procedem, como a rejeição por
livros que falem do assunto ou mesmo nas orações que fazem e nas músicas
que cantam. Por muito tempo compartilhei desse pensamento. Falar sobre
isso era como jogar uma barata dentro de uma refeição refinada num
restaurante chique. Mas tenho revisto essa posição. Hoje estou
convencido de que devemos sim pregar sobre o inferno e os perigos das
forças espirituais do mal – desde que as pregações sobre o assunto
tenham foco em Jesus.
A primeira razão que me fez rever essa posição foi a releitura do
Novo Testamento. Lendo as Escrituras e alguns bons livros descobri,
espantado, que Jesus de Nazaré falou mais nos Evangelhos sobre o inferno
do que sobre o Céu – sabia? Ou seja: o próprio Senhor abriu o
precedente. Afirmar que não se pode pregar sermões que tratem do mundo
espiritual maligno – com foco em Cristo, sempre – seria dizer que Jesus
não poderia ter falado o que falou. E repreender Deus é, no mínimo,
complicado. Se por um lado, o Senhor nos disse para não ficarmos
eufóricos com esse assunto (“Contudo, alegrem-se, não porque os espíritos se submetem a vocês, mas porque seus nomes estão escritos nos céus” – Lc 10.20), por outro nos instrui muitas vezes sobre ele (como em “Jesus
repreendeu o demônio; este saiu do menino [...] Então os discípulos
aproximaram-se de Jesus em particular e perguntaram: “Por que não
conseguimos expulsá-lo? “ Ele respondeu: [...] esta espécie só sai pela
oração e pelo jejum” - Mt 17.18-22).
Trabalho
como editor de livros cristãos. Meu último projeto – sobre o qual não
posso falar muito, por enquanto, por questões éticas – é uma obra de um
importante pastor presbiteriano brasileiro e chanceler de uma
universidades cristã. Tradicional. Histórico. E brilhante.
Surpreendeu-me, portanto, quando li em seu texto o seguinte: “Alguém
já disse que pregar sobre o inferno não é um caminho muito bom para
levar pecadores ao arrependimento, porque, nesse caso, as pessoas se
converteriam por medo da perdição eterna. Pessoalmente, entendo que é
preferível que seja assim ao fato de o indivíduo não se converter de
maneira nenhuma. Se alguém se converteu porque tem medo de ir para o
inferno, isso é ótimo, mas se a conversão ocorreu por amor a Jesus é
melhor ainda. Não faz mal o crente se assustar com a realidade da
justiça divina”.
Cada vez mais tenho percebido a importância de alertar a Igreja, como fez o próprio apóstolo Pedro, de que “o diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge, procurando a quem possa tragar”
(1 Pe 5.8). Forças do mal estão se infiltrando nas igrejas. Nas
empresas cristãs. Ensinamentos diabólicos estão conquistando espaço nos
corações e nas mentes dos jovens e adolescentes evangélicos. Temos
guardado os portões da frente de nossas vidas pela proclamação
indispensável do Evangelho de Cristo, mas, ao fecharmos os lábios contra
“as ciladas do diabo” (Ef 6.11), deixamos a porta dos fundos escancarada para a entrada dos sabotadores de nossa espiritualidade.
Portanto, é por isso que Paulo, o apóstolo, prega à igreja de Éfeso: “A
nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados
e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as
forças espirituais do mal, nas regiões celestes” (Ef 6.12). E
deixar de fora das nossas preocupações, do nosso discurso e da nossa
pregação essa realidade seria ignorar um assunto tratado extensamente
por Jesus e por seus discípulos nos evangelhos, nas epístolas e em
Apocalipse. Seria uma irresponsabilidade.
Em nossos dias, livros e relatos de ficção apresentados como
verídicos, como as histórias de Rebecca Brown e similares, prestaram um
desserviço à Igreja, por dois ângulos: de um lado houve quem cresse em
seus contos como se fossem realidade e passasse a viver segundo suas
ficções. Do outro, quem percebeu que se tratava de uma farsa passou a
ter um preconceito refratário a qualquer coisa do gênero, qualquer livro
que toque no assunto, qualquer música que mencione o diabo ou o
inferno. O satanismo, uma realidade tão presente e infiltrada nas
igrejas, ministérios e outros ambientes cristãos, tornou-se um assunto
sobre o qual não se deveria falar. Com isso, saiu perdendo a importância
bíblica e histórica de se tratar e de pregar sobre a questão. E quem
saiu ganhando? Preciso responder?
Até mesmo na música. O tradicional hino “Castelo Forte”, composto
pelo reformador Martinho Lutero, dedica quase metade de suas linhas ao
diabo e os demônios (depois que ele afirmou, veja você: “Não pretendo
deixar para o Diabo as melhores melodias!”):
“Castelo forte é nosso Deus,
Amparo e fortaleza:
Com seu poder defende os seus
Na luta e na fraqueza. Nos tenta Satanás, Com fúria pertinaz, Com artimanhas tais E astúcias tão cruéis, Que iguais não há na Terra.
A nossa força nada faz:
Estamos, sim, perdidos.
Mas nosso Deus socorro traz
E somos protegidos.
Defende-nos Jesus,
O que venceu na cruz
O Senhor dos altos céus.
E sendo também Deus,
Triunfa na batalha.
Se nos quisessem devorar Demônios não contados, Não nos podiam assustar, Nem somos derrotados. O grande acusador Dos servos do Senhor Já condenado está: Vencido cairá Por uma só palavra.
Que Deus a luta vencerá, Sabemos com certeza,
E nada nos assustará
Com Cristo por defesa.
Se temos de perder
Família, bens, poder,
E, embora a vida vá,
Por nós Jesus está,
E dar-nos-á seu reino.”
Amparo e fortaleza:
Com seu poder defende os seus
Na luta e na fraqueza. Nos tenta Satanás, Com fúria pertinaz, Com artimanhas tais E astúcias tão cruéis, Que iguais não há na Terra.
A nossa força nada faz:
Estamos, sim, perdidos.
Mas nosso Deus socorro traz
E somos protegidos.
Defende-nos Jesus,
O que venceu na cruz
O Senhor dos altos céus.
E sendo também Deus,
Triunfa na batalha.
Se nos quisessem devorar Demônios não contados, Não nos podiam assustar, Nem somos derrotados. O grande acusador Dos servos do Senhor Já condenado está: Vencido cairá Por uma só palavra.
Que Deus a luta vencerá, Sabemos com certeza,
E nada nos assustará
Com Cristo por defesa.
Se temos de perder
Família, bens, poder,
E, embora a vida vá,
Por nós Jesus está,
E dar-nos-á seu reino.”
É ingenuidade acreditar que basta pregar sobre Cristo sem falar nada
sobre o diabo e estaremos isentos das artimanhas e dos ataques do
maligno. Já ouvi o bom argumento de que para aprender a identificar a
nota falsa basta conhecer bem a verdadeira – só que, se a tinta da nota
falsa gera prurido e alergia em nossa pele, somente conhecer a
verdadeira não vai adiantar muito, depois que já manuseamos a
falsificada. A luz espanta as trevas, é verdade, mas me diga um cristão
com Jesus no coração que não peca porque aqui e ali se deixou enganar
pelas forças do mal. Como vigiaremos se não sabemos como é o inimigo?
Como estaremos alertas às “ciladas do diabo” se não temos conhecimento
de como ele age, o que faz, como se combate? Muitas tecnologias fajutas
de “batalha espiritual” ganham notoriedade em nossos dias justamente
porque houve muitos que ensinaram errado enquanto os que poderiam
ensinar certo deram as costas ao assunto.
Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício
Maurício
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