quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

O cativeiro intelectual do evangelho




Por Roosevelt Nunes
Na primeira epístola a Timóteo, Paulo honra a Igreja com o título de “coluna e fundamento da verdade”. Sobre isso, Calvino afirma: “a Igreja é a coluna da verdade porque, através de seu ministério, a verdade é preservada e difundida”. Embora a criação possibilite que conheçamos a realidade do mundo físico, este conhecimento é imperfeito e confuso por causa do pecado que corrompeu o intelecto humano. A revelação geral só é corretamente entendida por aquele que, mediante a iluminação do Espírito Santo, entende a especial [1]. Diante disto, a Igreja não pode fugir da mesa do debate público. E não deve fazer isso por temor ao Senhor, que deseja ver sua criação restaurada, e por amor ao próximo, uma vez que a humanidade vive num estado de caos por causa das trevas em que se encontra. Entretanto, hoje predomina um espírito de acomodação: a Igreja se exime da crítica dos valores de nossa cultura, utilizando avaliações seculares para fins de discussão. Caímos no erro do reducionismo: a mensagem cristã só se destina à salvação pessoal.
“E, por haverem desprezado o conhecimento de Deus, o próprio Deus os entregou a uma disposição mental reprovável…” (Rm 1.28a). Com base nesse versículo, Francis Schaeffer fala que, como os homens preferiram não reconhecer Deus no campo do conhecimento, Deus os entregou a uma mente destituída de critérios em todas as áreas da vida, tornando-se absolutamente loucos. Nesta condição, a realidade é enxergada de forma distorcida e, portanto, a sua análise terá uma série de equívocos. Os esforços dos cientistas sociais, por exemplo, alcançarão apenas os sintomas dos males da sociedade, nunca chegarão ao diagnóstico da doença, pois desprezam a Queda e o seu efeito sobre toda a criação.
Não sou favorável ao descarte de toda produção humana, mas julgo fundamental que não se esqueça o estado do autor: um homem caído. Passemos os olhos pelos diversos movimentos intelectuais, inicialmente de protesto, depois predominantes, tais como modernismo, existencialismo e relativismo, e veremos um elemento em comum: uma clara postura de oposição a Deus. Se passarmos a olhar o mundo através das lentes desses sistemas de crenças, ficaremos tateando na escuridão. “Porquanto, tendo conhecimento de Deus não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-lhes o coração insensato. E inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos” (Rm 1.21,22).
Deus deseja que a criação corrompida pelo pecado seja restaurada. Para tanto, a Igreja precisa ter uma postura ativa na discussão dos rumos de todas as áreas da vida. Na prática, isso resulta numa guerra cultural declarada entre a cosmovisão cristã e as várias cosmovisões seculares e espirituais que estão em ordem de combate contra elas [2]. O enfraquecimento de nossa posição nessa batalha se dá quando fazemos uma separação entre vida espiritual e secular, limitando o alcance do evangelho, reduzindo o mesmo a uma simples crença particular. Essa dicotomia, na prática, faz com que giremos em torno de dois pólos, o isolamento cultural e o ativismo pueril, sem a transformação do mundo decaído pela Palavra de Deus. E as conseqüências dessa mentalidade afetam também a esfera da fé privada. Como não somos ensinados a desenvolver uma cosmovisão bíblica, uma fé firmada no coração e na mente, quando nos encontramos num ambiente intelectualmente hostil, como a universidade, viramos presas fáceis às pressões da cosmovisão vigente, podendo levar a um afastamento gradual de nossas crenças.
Precisamos de uma religião do cérebro (educação em cosmovisão e apologética) para nos equiparmos na análise e crítica de cosmovisões concorrentes que encontraremos no mundo afora [3]. Só respondendo ao chamado de submeter toda existência ao comando do Deus que se revela nas Escrituras, a Igreja, o corpo de Cristo, será de fato coluna e fundamento da verdade. Do contrário, a verdade do evangelho continuará presa num cativeiro intelectual.

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