segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Maria, cheia de graça. E os outros, como ficam?

Por Lucas Banzoli 
 Há uma discussão muito grande no meio apologético, se Maria era “cheia de graça” ou “agraciada”. Sei que entrar na discussão sobre o original grego de Lucas 1:28 é pura perda de tempo. Ambos os lados estão armados até os dentes com argumentos que tem por base o original grego, mais especificamente com relação a uma palavrinha quase mágica, chamada “kecharitomene”. Bem, eu vou dizer aqui neste site anticatólico uma coisa que pode apavorar muitos crentes: -Sim, eu creio que Maria é “cheia de graça”! “Nossa, Lucas, agora você foi radical, pegou pesado, virou mariano!”, você poderia dizer. Calma. Antes que você discorde do que escrevi e me crucifique, é importante que você entenda exatamente o que estou querendo dizer: -Eu creio que todos os cristãos (não apenas Maria) que alcançam o favor divino são cheios da graça de Deus! Isso mesmo. Às vezes eu fico abismado em ver o bate-boca que se resume se Maria é o ou não “cheia de graça”, quando, na verdade, o ponto principal não tem nada a ver com isso, mas sim se os demais cristãos são desprovidos dessa plenitude da graça, que seria um atributo único e exclusivo de Maria. Portanto, o que deveríamos tentar fazer é ver se, biblicamente, os demais cristãos são cheios de graça ou se tem uma “graça pela metade”, ao invés de discutirmos se Maria era ou não era cheia de graça, o que é uma discussão secundária, importante somente para os devotos marianos fanáticos. A verdade bíblica é que todos aqueles que são preenchidos com a graça de Deus são “cheios de graça”. Não existe ninguém com uma “graça pela metade”. Deus não olha para um ser e diz: “Puxa vida, eu não fui muito com a tua cara. Vou te dar uma ‘meia-graça’, e é bom que fique contente com isso”! Aí ele olha pra outro e diz: “Você é mais simpático, vou te dar 80% de graça. E se você for muito bonzinho, fizer boas obras, pagar penitência e subir as escadarias da catedral de joelhos, vai ganhar uma promoção e terá 90% de graça! Daqui a pouco você chega lá”! Não, não, não... Essa teologia de “muita graça” e “pouca graça” é totalmente falida, antibíblica e cheia de engano. Deus não dá uma graça “meia-boca” ou “pela metade”. Ele sempre a dá sem limitações: “Porque aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus; pois não lhe dá Deus o Espírito por medida” (João 3:34) A Nova Versão Internacional traduz este verso da seguinte maneira: “Pois aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus, porque ele dá o Espírito sem limitações” (João 3:34) Portanto, Deus não dá do Seu Espírito “por medida”. Ele não o dá “limitado” a alguém, que fica “somente com uma parte”. Não. Ele dá o Seu Espírito completamente. É por isso que a Bíblia sempre diz que somos cheios do Espírito Santo (At.4:8; 7:55; 13:9; 9:17; Lc.1:55; 1:67), e não incompletos do Espírito Santo, tendo apenas uma parte dEle em nós. Acontece que com a graça divina é a mesma coisa que ocorre. Se Deus concede a nós o Seu Espírito de forma completa, de tal modo que ficamos “cheios” dele, então ele também não dá uma graça “incompleta”, pois o Espírito Santo é tão ou mais importante do que a própria graça de Deus. O Espírito Santo é uma pessoa, a graça não. O Espírito Santo é o próprio Deus, a graça é somente um favor de Deus. E, se a graça é um favor divino, o Espírito Santo é muito mais (Lc.11:13). Sendo assim, ser “cheio do Espírito Santo” é algo tão ou mais forte e significativo do que ser “cheio de graça”. Negar isso é inferiorizar o valor e importância do Espírito Santo na vida do cristão. E o que nós vemos é que todos os cristãos são “cheios do Espírito Santo”, e não apenas Maria: “Então Pedro, cheio do Espírito Santo, disse-lhes: Autoridades e líderes do povo...” (Atos 4:8) “Seu pai, Zacarias, foi cheio do Espírito Santo e profetizou” (Lucas 1:67) “Mas Estêvão, cheio do Espírito Santo, levantou os olhos para o céu e viu a glória de Deus, e Jesus de pé, à direita de Deus” (Atos 7:55) “Então Saulo, também chamado Paulo, cheio do Espírito Santo, olhou firmemente para Elimas e disse” (Atos 13:9) “Ele era um homem bom, cheio do Espírito Santo e de fé; e muitas pessoas foram acrescentadas ao Senhor” (Atos 11:24) “Ele nunca tomará vinho nem bebida fermentada, e será cheio do Espírito Santo desde antes do seu nascimento” (Lucas 1:55) “Irmão Saulo, o Senhor Jesus, que lhe apareceu no caminho por onde você vinha, enviou-me para que você volte a ver e seja cheio do Espírito Santo” (Atos 9:17) Em outras palavras, vemos que: 1º O Espírito Santo é um favor divino tão grande quanto a graça ou até maior. 2º Todos os verdadeiros cristãos são cheios do Espírito Santo, pois Deus não dá o Seu Espírito por medida, limitamente. 3º Sendo assim, a graça de Deus (que é outro favor divino) deve seguir este mesmo caminho: ela é dada liberalmente, e não por medida! Ora, se ser cheio do Espírito Santo é algo tão ou mais profundo do que ser cheio de graça, então este último não implica em ser imaculado ou sem pecado, pois todos aqueles que foram cheios do Espírito Santo, inclusive desde antes do nascimento (como é o caso de João Batista – Lc.1:55), pecaram. Vemos, portanto, que o argumento católico em favor da imaculada conceição de Maria tendo como única base bíblica o polêmico texto de Lucas 1:28 é no mínimo falaciosa. Se João Batista era cheio do Espírito Santo desde antes do seu nascimento e isso não o impediu de pecar, por que Maria deveria ser imaculada pelo simples fato de que (segundo os católicos) ela teria sido cheia de graça desde antes do nascimento? Não faz sentido, a não ser que o valor do Espírito Santo seja menor do que a graça. O que vemos é que o argumento católico é totalmente falacioso e sem sentido. Ser cheio de graça não é ser livre de pecado, mas ser cheio de favor divino. Graça é isso: favor imerecido. Ser cheio de graça implica, não em não poder mais pecar para o resto da vida, mas sim que Deus está em seu favor, ajudando-o. Mesmo Deus sendo totalmente a favor de todos os grandes homens do povo de Deus no passado, todos eles pecaram ao mínimo uma vez na vida. Por que com Maria deveria ser diferente? Além disso, biblicamente Maria não é a única pessoa a ser considerada “cheia de graça” por Deus. A Sagrada Escritura dá o seguinte testemunho acerca de Estêvão: “Estêvão, homem cheio da graça e do poder de Deus, realizava grandes maravilhas e sinais entre o povo” (Atos 6:8) Aqui vemos que Estêvão também era “cheio de graça”; portanto, tal coisa não era nem nunca foi “exclusividade” de Maria. A expressão usada aqui para Estêvão é no original grego χαριτος [charitos], que é exatamente a mesma de onde provém a palavra grega “kecharitomene”, que foi dirigida a Maria. Ambas são do verbo “charitoô”, e significam “favorecer” ou “encher de favores”. Portanto, Estêvão também era “cheio de graça” [charitos] tanto quando Maria era “cheia de graça” [charitos]. Alguns católicos argumentam que o tempo verbal para Maria em Lucas 1:28 é diferente do tempo verbal para Estêvão em Atos 6:8. Que grande descoberta! Que diferença faz? Os católicos argumentam que o tempo no particípio perfeito significa que Maria sempre foi cheia de graça, diferentemente de Estêvão, que teria recebido graça a partir daquele momento. Mas eu continuo repetindo: Eeee... daí? Isso não muda nada. Será que depois de Atos 6:8 Estêvão passou a ser “imaculado”? É claro que não. Então, tal palavra não tem nada a ver com cometer ou não cometer pecados. Se ela foi aplicada a Estêvão e nem por isso Estêvão deixou de ser pecador nem por um instante, então mesmo se a interpretação católica estivesse correta e implicasse que Maria sempre foi cheia de graça, isso igualmente não implicaria que Maria não era pecadora. Além disso, o verbo se encontra no particípio presente porque o anjo quis corroborar com as palavras de Isaías em Isaías 7:14, que profetizou, há muito tempo antes, que uma virgem conceberia. Portanto, a razão do verbo no particípio presente não tem nada a ver com Maria nunca ter pecado (pois já vimos que charitos jamais implicou em não ter pecados), mas sim para indicar que a graça recebida por Maria já era algo esperado e anunciado desde há muito tempo (antes do nascimento da própria Maria), pois o próprio Deus já havia predito, muitos séculos antes, que uma virgem seria escolhida para dar a luz ao Salvador do mundo. Prova disso é que logo em seguida, no verso 30, o mesmo verbo é aplicado no tempo presente (o mesmo que foi aplicado para Estêvão e para os demais), e não mais no particípio perfeito: “Disse-lhe, então, o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça [χαριν [charin] Acus. Sing] diante de Deus” (Lc.1:30). Além disso, vemos, biblicamente, que todos os cristãos são cheios de graça (não apenas Maria e Estêvão), pois Paulo se referiu a todos os cristãos quando disse: “para o louvor da glória da sua graça, com a qual nos encheu de favores (ou “nos encheu de graça”, echaritôsen) no Amado” (Ef.1:6). Essa passagem de Efésios nos diz que Deus nos “encheu de graça”, e Paulo usa precisamente o mesmo verbo charitoô, apenas mudando o tempo verbal, o que obviamente não muda o significado do verbo. Vemos também o apóstolo Paulo dizendo com respeito a todos os cristãos o seguinte: “E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda a boa obra” (2ª Coríntios 9:8)

Informação ou conhecimento?

Por Gabriele Greggersen 
Fiquei bastante intrigada nesses dias com a notícia de que todos os produtos do supermercado devem conter a informação sobre os impostos devidos ao governo, embutidos no preço. Como bem observou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, essa nova resolução é impraticável, já que isso aumentará o custo dos produtos, o que reverterá sobre o preço. Tirando esse aspecto bastante paradoxal, há outro detalhe que penso ser digno de nota: essa informação é útil? Não é só pelo aspecto de que sejam raros os consumidores que leem as informações contidas na embalagem dos produtos (quem sabe eu pudesse me limitar a dizer que sejam “raros os consumidores que leem”....), mas mesmo que eles leiam, que efeito essa informação terá na vida do consumidor? Pois, se essa pergunta não é feita, a informação valerá pela mera informação, e não como conhecimento útil. Na prática, pouco ou nenhum efeito terá a informação sobre o fato de pagarmos impostos absurdos toda vez que vamos ao supermercado. Poderíamos comparar essa resolução com aquela do “ficha limpa”. Neste último caso, a informação, ao atingir o eleitor, terá efeitos visíveis e concretos. Mas que efeito se poderá esperar da informação sobre o imposto do produto? Quem sabe ficaremos mais apreensivos e se tivermos os meios de influenciar a cobrança de impostos, quem sabe essa informação mude alguma coisa. Você pode me dizer que sou cética, que a informação sempre é válida, que as pessoas, ao se conscientizarem de certas realidades, poderão alterá-la. O que me incomoda nessa teoria é a crença de que só a informação possa alterar a realidade. Mas enquanto tal informação não for canalizada para se tornar conhecimento, de nada ela adiantará para alterar a realidade. Somos diariamente bombardeados por informações. Mas quantas delas alterarão nossa vidas na prática? Quantas são as pessoas que na sociedade da informação reduzem o conhecimento ao dado? Cremos piamente que “a voz do povo é a voz de Deus”. E se o povo estiver errado? E se a crença na democracia for uma falsa impressão de justiça, que é um passo além da democracia? E quantos sabem o que a democracia significa na prática? No mundo cristão, quantos são os cristãos que confundem conhecimento com informação? Quantos são os que vão à igreja à espera de informação, e não de conhecimento transformador? E quantos são os pastores que atendem a tal expectativa para manter o seu público interessado? E quantos são os pregadores, eles mesmos, que confundem conhecimento e informação? Se a informação fosse conhecimento, a igreja seria logo substituída pela pregação virtual. E onde fica a comunhão? Não sou contrária à sociedade da informação, mas sou muito mais favorável à sociedade do conhecimento. Enquanto a informação é como o dado colhido no laboratório pelo médico, o conhecimento é a prescrição completa que o médico formulará com ajuda dos dados. A diferença entre as duas coisas é significativa. Conhecimento tem a ver com intimidade, com convivência com diálogo e com transformação.

O maior no Reino de Deus

Por Maurício Zágari 
Cada civilização contém conceitos que são considerados as maiores virtudes entre as pessoas que a formam. Na Grécia antiga, por exemplo, o poder de argumentação era tão valorizado que existiam escolas voltadas especificamente para ensinar a debater. Em certas tribos aborígenes, trair alguém antes de matá-la dava status, como revela o livro O totem da paz. Também não são poucas as sociedades ao longo da História em que os mais fortes fisicamente são e foram os mais louvados. A espiritualidade e a obediência ao Alcorão são bem vistas em culturas islâmicas. Em certas sociedades orientais, a honra era vista como o valor principal de um homem. E na nossa? O que dá destaque a um indivíduo na cultura ocidental do século 21, em que eu e você estamos imersos? Basicamente o que chamo de “os três F”: fama, fortuna e físico. Quer ser o maior entre os seus semelhantes no Brasil de hoje? Então seja famoso: destaque-se, apareça mais que os outros, seja venerado, que muitos olhos se voltem para você. Ou então ganhe muito dinheiro, ostente carros caríssimos, more numa mansão, demonstre como você é bem-sucedido financeiramente. Por fim, tenha um aspecto físico invejável, seja por uma beleza natural ou por recursos como malhação, cirurgias plásticas, implante de silicone, botox, cabelos bem cortados – ou ainda, por roupas e sapatos caríssimos e da grife que está na moda. Pronto. Você será visto com destaque, valorizado, bajulado, invejado, amado. Mas… e no Reino de Deus? O que destaca alguém? Acredite: o exato oposto daquilo que dá destaque a um indivíduo na cultura ocidental do século 21: Humildade. O pecado de Satanás foi a arrogância. Ele quis ser mais do que era. Deu no que deu. Podemos contrastar sua atitude com a do grande profeta João Batista, sobre quem o próprio Jesus disse: “Eu lhes digo que entre os que nasceram de mulher não há ninguém maior do que João” (Lc 7.28). Sendo João isso tudo, ele mesmo afirmou: “Depois de mim vem alguém mais poderoso do que eu, tanto que não sou digno nem de curvar-me e desamarrar as correias das suas sandálias” (Mc 1.7). João sabia quem era. Mas, mesmo sendo o maior de todos os que haviam nascido em toda a história da humanidade, ele conhecia seu lugar. Sabia que era pó. Que exemplo para todos nós… Nossa civilização nos condicionou a querer sempre um lugar de destaque. Um emprego que nos projete. Títulos. Nosso nome escrito em letras de neon. Elogios. Um ego muito bem nutrido por palavras que mostrem como nós somos grandiosos. Mas o que Jesus ensina contraria de frente essa mentalidade: “Bem-aventurados os humildes, pois eles receberão a terra por herança. (Mt 5.5). Que diferença! E a afirmação que não deixa dúvida alguma (peço que você leia essas palavras de Jesus com muita atenção): “Quem se faz humilde como esta criança, este é o maior no Reino dos céus” (Mt 18.4). Humildade na terra, grandeza no Céu. Diminuir para crescer. Jesus é o único digno de abrir o livro, Jesus é o maior, Jesus é maravilhoso, Jesus é o Altíssimo, Jesus é Criador, Jesus é o Caminho, Jesus é amor, Jesus é o santíssimo, Jesus é o Onipotente, Jesus é tudo. No entanto: “Jesus sabia que o Pai havia colocado todas as coisas debaixo do seu poder, e que viera de Deus e estava voltando para Deus; assim, levantou-se da mesa, tirou sua capa e colocou uma toalha em volta da cintura. Depois disso, derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos seus discípulos, enxugando-os com a toalha que estava em sua cintura. [...] Disse Pedro: “Não; nunca lavarás os meus pés”. Jesus respondeu: “Se eu não os lavar, você não terá parte comigo”. [...] Então lhes perguntou: “Vocês entendem o que lhes fiz? [...] Pois bem, se eu, sendo Senhor e Mestre de vocês, lavei-lhes os pés, vocês também devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei o exemplo, para que vocês façam como lhes fiz” (Jo 13.1-15). Permita-me perguntar: qual foi a última vez que você seguiu esse exemplo e “lavou os pés” de alguém menor do que você? Entre nós, cristãos, certas características nos dão destaque no meio dos irmãos. O santo se acha mais santo do que os outros. O que ora muito crê que isso o torna mais especial do que os demais. O pecador condena quem julga que é mais pecador do que ele. O que tem um cargo na igreja se acha mais do que o que não tem. O que manifesta um dom se acha mais agraciado por Deus. Em resumo, eu e você não estamos isentos de nos acharmos os tais porque fazemos ou somos algo que nos põe numa posição de destaque. Já parou para pensar por que os cristãos são tão fascinados por escândalos? Já parou para pensar por que amamos falar sobre aquele pastor famoso que caiu em adultério? Já parou para pensar por que comentamos salivando que a cantora gospel famosa rastejou no palco? Já parou para pensar por que temos um prazer indizível em comentar o último pecado que fulano cometeu? Em suma, já parou para pensar por que temos o prazer sádico de tricotar entre nós quando algum outro cristão incorre em desgraça? Porque isso faz com que nós nos sintamos superiores. Pura e simplesmente isso. É um sentimento mesquinho que, até inconscientemente, nos faz pensar “não sou tão mau assim, afinal fulano é um tremendo pecador, muito mais do que eu, que vivo tão corretamente”. É por isso que a maioria prefere segregar o pecador e não lhe dar um único telefonema para saber como ele está em vez de se aproximar, amar, dar ombro, dar afeto, ajudar em sua restauração: porque gostamos demais de nós mesmos para gostarmos dos outros. Certa vez entrevistei o ator e comediante Jerry Lewis. Perguntei a ele como explicava seu sucesso. Sua resposta foi simples: “Todo filme que faço se baseia num princípio: um homem em apuros. E cada pessoa do público fica feliz porque quem está naquela situação embaraçosa ou complicada é outro e não ela mesma”. Ou seja: rimos da desgraça do outro porque isso nos faz nos sentirmos melhor conosco. Não fosse assim, como explicar o sucesso das videocassetadas? Pessoas se arrebentando no chão, levando tombos, sendo atropeladas, pegando fogo… e nós daqui caindo na gargalhada. Os cristãos, inclusive – sejamos honestos. Como explicar esse contrassenso absoluto? Simples: a desgraça alcançou o outro e não nós. Quando o outro peca isso faz dele inferior aos olhos dos cristãos. Portanto, um pecado que tornou alguém um escândalo faz com que eu, que também peco todos os dias mas não virei escândalo, me sinta melhor, mais feliz comigo mesmo. Superior. Maior. Sinto orgulho de mim mesmo, essa é a grande verdade. No entanto, as palavras de Paulo atravessam nosso sentimento de superioridade como uma espada afiada: “Se devo me orgulhar, que seja nas coisas que mostram a minha fraqueza” (2 Co 11.30). Essa é a proposta do Evangelho. Reconhecer nossa fraqueza. Reconhecer nossa falibilidade. Pois, enquanto nos achamos mais especiais do que os demais, sofreremos do traiçoeiro pecado do “orgulho santo” – o orgulho do que há de bom em nós, o orgulho até de nossa “santidade”, tão maior do que a dos demais. Mas se nos achamos tão melhores do que os outros, não abrimos espaço para nos escancararmos para Deus, como Paulo fez: “Miserável homem que eu sou!” (Rm 7.24). Não. Diremos em nosso íntimo (sem falar em voz alta, para não pegar mal): “Magnífico homem que eu sou!”. Assim, nos sentiremos mais. Nos sentiremos os eleitos, os profetas, os escolhidos, os queridinhos do Pai. Nos sentiremos superiores. E nos sentiremos aliviados por não sermos tão ruins como os outros. Só que… com isso, não reconhecemos nossas fraquezas e não reconhecemos que o pior dos pecadores não é pior do que nós. E no dia em que estivermos diante do trono de Deus para prestar contas de tudo o que fizemos e falamos, será que o que ouviremos dele é “você é realmente o tal”? Prefiro ficar com Paulo, que em Romanos 7.18 confessa com uma humildade que não encontramos em quase ninguém em nossos dias: “Sei que nada de bom habita em mim, isto é, em minha carne. Porque tenho o desejo de fazer o que é bom, mas não consigo realizá-lo”. Não é à toa que Paulo foi Paulo. Pois, talvez lembrado pelo espinho na carne, reconhecia que só a graça lhe bastava e que só a graça fazia dele um vaso de barro com a excelência do fôlego de vida em si. Fico muito triste ao ver cristãos que se acham mais do que outros, seja por que razões forem. E oro por muitos que conheço e que são assim. Ore por mim também, por favor, pois não sou melhor do que meus pais. Em vez de nos acusarmos, nos rebaixarmos e nos segregarmos, amemo-nos mais e oremos mais uns pelos outros. No grande e terrível dia em que estaremos diante do Justo Juiz, que ele olhe para nós e veja a cruz de Cristo. Porque, se Ele olhar para quem nós realmente somos (e não para quem achamos que somos) nada nos restará a não ser choro e ranger de dentes. Sou um pecador, mas se puder fazer algo por você, meu irmão pecador, minha irmã pecadora, tentarei. E não te desprezarei pelo fato de que você pecou um pecado diferente do meu e que ingenuamente considero pior. Pois… quem sou eu? “Pois qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos” (Tg 2.10). Quem sou eu… Paz a todos vocês que estão em Cristo, Maurício.

Ambivalência é o câncer desta geração!

Por Josemar Bessa 
Há pregadores que adoram frases do tipo: “Todo ponto de vista é a vista de um ponto” – O que eles desejas ensinar com isso? Brian McLaren resume essa mentalidade na introdução ao seu livro A New Type of Christian ("Um Novo Tipo de Cristão"): “Dirijo meu automóvel e ouço a estação de rádio cristã, algo que minha esposa sempre diz que devo parar de fazer ("porque isso só deixa você nervoso", diz ela). Ali, ouço um pregador após outro se mostrando absolutamente seguro de suas repostas, que são até à prova de bombardeio, e das suas interpretações bíblicas infalíveis... E, quanto mais seguro ele parece, tanto menos desejo ser um cristão, porque neste outro lado, distante do microfone, das antenas e do locutor, a vida não é tão simples assim; as respostas não são tão claras assim; e nada é tão seguro assim”. Deste modo, o pós-modernismo "evangélico" chegou a transformar em virtude sublime toda dúvida, incerteza e hesitação a respeito de quase todos os ensinos das Escrituras. Convicções fortes, afirmadas com clareza, são invariavelmente rotuladas como "arrogância" por aqueles que favorecem o diálogo pós-modernista. Cristo sempre nos guia na Verdade, e Ele nos faz viver o evangelho e proclamá-lo fielmente, não como um nariz de cera que pode ser moldado por cada um segundo suas conveniências, e é assim que Ele nos guardará de “tropeçar, e nos apresentará diante da Sua glória sem mácula e com grande alegria” (Judas 24). Ambivalência é como uma corda que, se não verificada, torna-se uma algema que prende o homem à heresia. Ambivalência é o câncer desta geração! O relativismo é uma revolta contra a realidade objetiva de Deus. A mera existência de Deus cria a possibilidade da verdade absoluta. Deus é a norma suprema e final para todas as alegações de verdade. Quem ele é, o que ele quer, o que ele diz, é o padrão externo e objetivo para se medir todas as coisas. Se o mundo acha isso relevante ou atrasado, isso não faz a menor diferença. E sua revelação é clara, mas jogamos fumaça sobre ela quando queremos agradar ao mundo mostrando que tudo não passa de pontos de vistas diferentes. Que a verdade é subjetiva. Quando o relativismo diz que não existe um padrão de verdade e falsidade que é válida para todos, ele fala como um ateu. Ele comete traição contra Deus. O relativismo é uma rebelião generalizada contra o próprio conceito de direito divino. Portanto, é a rebelião mais profunda contra Deus. É uma traição que é pior do que a revolta total, porque é desonesto. Continua pregando um "evangelho" que na realidade não é verdade absoluta externa a nós. Era melhor dizer que não crê ser ele a verdade e pronto. É realmente pior de que uma revolta total. É realmente desonesto - pois devia dizer na face de Deus, "A tua palavra é falsa". Dizer: "A tua palavra é ambígua..." - dizer: "Não há tal coisa como uma palavra universalmente objetiva revelado por Deus" – Mas não usa dessa clareza honesta, e então deixa o que chama de "verdade" como algo aberto para cada homem moldar as coisas segundo seu coração enganoso. Isso é traição. Ah! A loucura das mentes descuidadas abertas para tudo e caindo por nada, já dizia alguém. Todas as pessoas que são superficialmente “ortodoxas”, que dizem que “todo ponto de vista é a vista de um ponto”, transformam a verdade das Escrituras em mentira. Essa abordagem tem sido mencionada, por alguns, como "uma hermenêutica da humildade" — como se fosse inerentemente orgulhoso demais para um pregador o imaginar que ele sabe aquilo que Deus disse a respeito de alguma coisa. É claro que essa negação de toda a certeza não tem qualquer indício de verdadeira humildade. De fato é arrogância, arrogância contra Deus. De fato, isto é realmente uma forma arrogante de incredulidade, arraigada na recusa imprudente de reconhecer que Deus foi suficientemente claro na revelação que fez de Si mesmo às suas criaturas. Essa atitude é uma forma blasfema de arrogância e, quando ela governa até a maneira como alguém maneja a Palavra de Deus, se torna outra expressão de rebeldia maligna contra a autoridade de Cristo. Era melhor dizer abertamente: eu amo a mente do mundo (minha própria mente), não a de Deus. Quando a verdade objetiva desaparece na névoa do relativismo, não somos mais um humilde servo para a proclamação preciosa verdade. Um homem assim joga fora o jugo da servidão e assume um poder próprio. Ele não se submete à realidade objetiva externa, ele cria a sua própria "realidade". Ele não serve mais para mostrar a verdade. Ele passa ser a fonte de autoridade que define o que é a verdade. E todos alegremente aplaudem, pois cada um pode ter a “sua” própria “verdade”, já que ““todo ponto de vista é a vista de um ponto” Devemos tomar o jugo da Verdade revelada mesmo que a cultura à nossa volta a ache loucura e escândalo, mesmo que ela não se adapte para se tornar “relevante” para o mundo. Todos os amantes da verdade são humildes, mas apesar de tentar vender isso desonestamente, o relativismo não é uma postura humilde, mas um manto de orgulho, altivez contra Deus, uma heresia destruidora!